Uma pesquisa em andamento no município de Terra Nova do Norte (170 km de Sinop) está levando esperança aos produtores de maracujá de Mato Grosso e reativando a cultura no estado. O trabalho, conduzido em parceria entre Embrapa e a cooperativa Coopernova, valida a resistência à fusariose de maracujazeiros enxertados. Causada pelo fungo Fusarium oxysporum f. passiflorae, a doença atinge as raízes e mata as plantas em poucos dias, inviabilizando o cultivo em áreas infectadas.
Dados preliminares mostram que ao menos um dos três porta-enxertos utilizados tem se mostrado resistente à doença nas condições climáticas e de solo daquela região. Enquanto as plantas cultivadas sem enxertia (pé-franco) morreram e algumas das enxertadas em Passiflora alata e Passiflora gibertii também já apresentaram o problema, todas as plantas enxertadas em Passiflora nitida permanecem vivas, sem sintomas e produzindo bem.
Plantas enxertadas permanecem vivas, sem sintomas e produzindo bem
O resultado é um alívio para os produtores, uma vez que a fusariose praticamente inviabilizou a cultura do maracujá na região de Terra Nova do Norte. Entre 2008 e 2009, mais de 300 cooperados produziam maracujá. A produção era vendida in natura ou processada na agroindústria da cooperativa. Em dois anos, cerca de 90% dos produtores abandonaram a atividade devido aos problemas com a doença. O prejuízo com a perda do investimento se somou a uma capacidade ociosa de cerca de 85% da indústria de beneficiamento da Coopernova.
Adversidade leva à solução
O problema foi tão grande na região que, a partir dele, surgiu a solução. Primeiramente, produtores e a equipe técnica da cooperativa observaram que nas mesmas áreas onde as plantas de maracujá-azedo morriam, havia espécies de maracujá silvestre que permaneciam vivas. Intrigados, foram buscar na pesquisa formas de utilizar aquela resistência em plantas de maracujá-azedo.
A solução foi encontrada em uma técnica de enxertia de maracujazeiro desenvolvida há cerca de 15 anos. Responsável pela inovação, o pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril Givanildo Roncatto explica que, diferentemente de outras espécies como mangueira e citros, por exemplo, a enxertia no maracujá não depende da retirada de galhos de plantas adultas.
“Na fase de viveiro se utiliza 100% de mudas jovens. Você produz tudo por semente, não só o porta-enxerto, mas também a planta que vai dar origem à copa. As plantas jovens não possuem caule oco, como as adultas. O caule oco é um problema, pois a planta enxertada não vinga”, explica Roncatto.
O diretor técnico da Coopernova, Carlos Távora, foi quem começou a coletar e multiplicar as sementes do maracujá silvestre, que depois veio a ser identificado como Passiflora nitida. Ele utilizou as mudas como porta-enxerto e, desde então, com apoio da Embrapa, vem desenvolvendo testes em viveiro e no campo. Os bons resultados levaram ao retorno do interesse dos agricultores.
Atualmente cerca de 90 agricultores voltaram ao cultivo do maracujá. Todos eles utilizando as mudas enxertadas produzidas no viveiro da Coopernova. De acordo com Távora, a demanda dos cooperados chega a 40 mil mudas por ano, três vezes maior do que a capacidade de produção.
“Se a gente tiver condições de atender às demandas dos produtores, não só da região, como do estado, a tendência é de um aumento progressivo não só da área, como também da produtividade de maracujá no estado. A fusariose tem sido uma limitação por provocar alta mortalidade de plantas. Como na enxertia nós praticamente zeramos essa mortalidade, a tendência é de aumento”, prevê Carlos Távora.
Um dos produtores que chegou a abandonar a produção de maracujá após a morte de quatro hectares de lavouras foi Odair Piccini. Hoje, graças às mudas enxertadas, retornou à atividade e já possui oito hectares plantados.
“O pegamento das mudas é bem satisfatório. Está fácil de mexer. Aumentou a produtividade em uns 25%, ou mais, e ainda é melhor para o controle de doenças. Como dá menos ramada, facilita o combate ao ácaro e à cochonilha”, avalia o produtor, que tem planos de expandir o plantio de maracujá para 15 hectares e cede seu sítio para desenvolvimento da pesquisa.
Aumento da produtividade
A pesquisa conduzida pela Embrapa em Terra Nova do Norte ainda está em andamento e só terá dados finais sobre produtividade após o fim do ciclo de dois anos. Entretanto, avaliações feitas pela equipe da Coopernova demonstram que os pés enxertados são mais produtivos do que os pés-francos.
Em áreas já com três anos de produção, observou-se que no primeiro ano os pés-francos produzem mais. No segundo ano há um equilíbrio e no terceiro as plantas enxertadas produzem mais. A maior longevidade das plantas é outro aspecto ainda em avaliação, mas a equipe da cooperativa já está estendendo de dois para três anos o ciclo da cultura.
Outra preocupação dos pesquisadores é com a possibilidade de haver incompatibilidade entre a copa e o porta-enxerto, causando danos à copa.
“Uma incompatibilidade leva à diferença no diâmetro de caule. Aí pode haver morte de planta, ou então crescimento menor. No experimento, estamos verificando que existe alguma incompatibilidade com o porta-enxerto, principalmente P. gibertii. Mas acredita-se que isso vai ser até benéfico, na medida em que desenvolve menos a parte vegetativa e a planta produz mais. Ocorre um equilíbrio. Menor crescimento vegetativo e maior produção de frutos”, avalia Roncatto.
Qualidade dos frutos
Para garantir a viabilidade do uso de porta-enxertos resistentes à fusariose, também foram avaliados indicadores de qualidade dos frutos. Aspectos físicos e químicos foram testados. De acordo com a pesquisadora da Embrapa Sílvia Campos, não foram encontradas diferenças em relação aos frutos de pés-francos.
“O que temos de ter em vista na pós-colheita é se os frutos são adequados para o mercado, se não há prejuízo na qualidade dos frutos, independentemente dos tipos de porta-enxerto. Pudemos observar que não há diferença, apesar de a quantidade de sólidos solúveis (quantidade de açúcar) dos frutos enxertados ser superior à dos frutos colhidos em pés-francos”, explica Sílvia Campos.
Até o momento, a pesquisa só trabalhou com a cultivar BRS Rubi do Cerrado na copa. A próxima etapa será testar outras cultivares e todas as avaliações serão refeitas.
“É importante que as características das cultivares usadas na copa se mantenham, mesmo com a utilização do porta-enxerto. Se tivermos alguma resposta ruim, é provável que aquela combinação de cultivar e porta-enxerto não seja indicada para determinada região”, afirma a pesquisadora.