Em agosto de 1973, na cidade de Estocolmo, capital da Suécia, após um assalto mal sucedido a um banco, algumas pessoas ficaram reféns de dois criminosos. Na ocasião, as vítimas desenvolveram empatia e afeto por ambos, inclusive, defendendo-os da ação da polícia e da justiça, num gesto de condescendência com o ato.
Esse comportamento psicológico foi denominado de Síndrome de Estocolmo pelo criminólogo e psicólogo Nils Bejerot, que acompanhou toda a operação da polícia no resgate das vítimas e na prisão dos assaltantes-sequestradores.
Basta examinar a legislação brasileira, de natureza penal e processual penal, editada nos últimos tempos, para se perceber que o Congresso Nacional tem desenvolvido uma espécie de Síndrome de Estocolmo, já que, gradativamente, tem aditado o contrato social de cláusulas benéficas para aqueles que furtam, roubam, estupram, sequestram e matam o semelhante.
É a destutela da sociedade. Às vítimas, às famílias vitimadas, às potenciais vítimas e ao corpo social, ao que parece, só restam a indiferença estatal.
O início dessa síndrome está bem demarcado pela publicação da Constituição Federal, em 05 de outubro de 1988, pois, como se estivesse legislando para presos políticos, garantiu aos autores de crimes comuns uma enorme gama de direitos, que contempla desde o direito à mentira até o de serem presos somente após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Vale dizer, cuida-se de um verdadeiro arsenal contra o dever de punir do Estado.
Não bastasse isso, após o contraditório e a ampla defesa, o cumprimento da pena é um genuíno faz-de-conta, um claro exemplo de farsa. São vários institutos jurídicos garantidores da descarcerização, quais sejam: transação penal, suspensão condicional do processo, penas alternativas, suspensão condicional da pena, regimes penitenciários semi-aberto, aberto e domiciliar, livramento condicional, remição da pena pelo trabalho, remição da pena pelo estudo, saídas temporárias, indulto, graça e anistia…
Em meio a esse quadro lamentável, não há mais que se falar em finalidade da pena, já que esta, em sua essência, é retributiva, “punitur quia peccatum" – pune-se porque pecou.
E o pior: tudo isso frente à escalada crescente da criminalidade, pois, segundo dados concretos, neste país, há cerca de cinquenta mil assassinatos por ano.
Isso tudo demonstra que, apesar do caos instalado na (in)segurança pública e do lema “ordem e progresso” cravado na bandeira nacional, os criminosos, continuamente, são agraciados pelo parlamento com a edição de uma miríade de leis complacente com o crime e indiferente à proteção do corpo social.
Assim, com tantos direitos aos criminosos, a pessoa de bem, esfoliada por tributos escorchantes, aguarda, bovinamente, a decretação tácita de sua prisão em regime integralmente fechado, no seu próprio domicílio, por força da crescente criminalidade, enquanto aqueles ficam à procura da próxima vítima.
Por tudo isso, incumbe ao parlamento brasileiro abandonar essa odiosa política criminal laxista e leniente com os algozes da sociedade. Do contrário, quem viver, se viver, verá a lei funcionando como meio de produção da violência, em vez de ser instrumento de pacificação e proteção social.
Enfim, não há mais lugar para a Síndrome de Estocolmo em solo brasileiro. Já passou do tempo das ovelhas terem legisladores que as defendam, para que a história não continue sendo escrita pela ação dos lobos.
César Danilo Ribeiro de Novais – Promotor de Justiça no Mato Grosso e Editor do blogue www.promotordejustica.blogspot.com.