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O natal dos homens e o Natal do Menino Jesus

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Era Natal. Eu vi o brilho nos olhos de uma criança feliz e vi, na felicidade daquela criança, o sorriso da minha felicidade interiorizada. Acredito que, naquele momento, um traço de alegria pode ser notado iluminando minha face. Era Natal.
Momentos depois, o mesmo brilho, nos olhos de uma outra criança, não era o brilho de uma criança feliz. Reluzia como o da primeira, porém, possuía uma diferente moldura. Era o brilho nos olhos de uma criança que observava. Observava a felicidade da outra enquanto, em seu interior, calava um perceptível desejo de participar da mesma alegria. Acredito também que, naquele momento, pôde ser notado, rasgando a minha face, um traço de tristeza. De tristeza pela existência de duas crianças que traziam nos olhos o mesmo brilho e diferentes emoções. Era Natal.

Após a refeição vespertina, eu e Helena conversamos muito. Conversamos sobre essas coisas que por serem tão corriqueiras em nossas vidas, apresentam-se, a nós, como simples e amenas, embora, tão vivas e tão reais nos olhos das crianças. Crianças, umas, que, saltitantes, desfrutam de um mundo teoricamente perfeito e crianças, outras, que nutrem o desejo dessa perfeição. Crianças, essas, que, por isso, carregam nos olhos o brilho da indagação. Era Natal.
A semana havia sido de intensa correria. Visita às lojas do calçadão e aos shoppings para aquisição de arranjos natalinos, produtos para a ceia, compras de presentes para o amigo oculto ou simplesmente para a satisfação do ego de cada um que não eram poucos e a cada ano se multiplicava assustadoramente, por isso, para manutenção do hábito, os presentes eram reduzidos em valores e qualidades. Era Natal.

Era Natal e nós estávamos ali na cozinha conferindo o ordenamento das coisas para a hora da ceia que não deveria tardar o adentrar dos primeiros que ceariam conosco. Era Natal. Na sala, a TV iniciava o ritmo de boas vindas ao Deus que em instantes nasceria menino e isso reativou em mim, mais uma vez, a lembrança daquelas duas crianças. Menino ou menina, não importa. As duas – representantes de milhões de outras – faziam parada no meu cérebro que passou a viajar em pensamentos que buscavam uma outra ordem para as coisas. Olhei para Helena e ela tentou disfarçar num sorriso, como se engraçasse do meu jeito inquieto de colocar e recolocar os pratos, misturados às talheres, nozes e doces. Era Natal.

– Eu sei Cal – era assim que Helena e os amigos mais íntimos me chamavam – eu também estou confusa, revelou num sussurro como quem de repente se desprende de um segredo.
Era Natal. Os parentes e alguns amigos começaram a chegar. Haveria outros natais, certamente. Mas aquele – eu e Helena combinamos, no silêncio, seria o último que viveríamos naquele esplendor puramente material. Os outros – pactuamos – seriam vividos com intensidade. Intensidade única. Seriam dedicados às crianças. A todas as crianças, mas, preferencialmente àquelas que, embora com o mesmo reluzente brilho nos olhos, apenas observam como o menino Jesus que em todo Natal, deve observar as festas que nós, os homens, fazemos para homenagear a data do seu nascimento: o Natal.

Carlos Alberto de Lima é jornalista em Alta Floresta
[email protected]

 

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