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Em casa de ferreiro espeto de pau

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Confesso que fiquei incomodado quando fiquei sabendo da aprovação, quase que por unanimidade, pelos senhores e senhora deputada do nome do deputado Campos Neto para ocupar a vaga de seu pai no Pleno do Tribunal de Contas do Estado de Mato (TCE/MT). O incômodo não foi menor quando soube da homologação por parte do senhor Governador, referendando o nome para o TCE/MT.

E me pus a fazer perguntas: o que o deputado Campos Neto fez como parlamentar para que pudesse ter essa indicação? Tento, tento, fecho os olhos e, num esforço considerável, me envolve um momento de angústia. Será uma premiação? O que justifica alguém ser indicado para uma nomeação como Conselheiro do Tribunal de Contas? Serviços prestados à municipalidade a que pertenceu? Serviços prestados à população no Estado? Quais e em que grau foram as intervenções do nobre deputado nas questões sociais e financeiras dos municípios e do Estado?

Confesso que não consegui respostas de imediato. Mas minha angústia e reflexão não pararam por aí. E me pus a pensar nas últimas nomeações para o TCE/MT. De novo me rondavam os questionamentos. Mas agora, diante do fato consumado, inclusive pelo senhor Governador, não resisti a uma questão: em que sentido uma nomeação como essa ajuda na luta pelo fim do nepotismo iniciada pelo Judiciário. E no Legislativo? Não é o TCE/MT um órgão de assessoramento superior da Assembleia Legislativa? Não é o pai do próprio deputado que está para se aposentar e em seu lugar entra seu filho? Mas, ele foi aprovado pelos deputados. Tudo em família? Não nos parece familiar e se assemelha a velha prática de “herança” política? Nesse caso, o que pensar de um Tribunal de Contas que se sujeita a tais relações? Tribunal de Contas? Que julga contas? O que esperar?

Nesses momentos, não paro de pensar no árduo trabalho de técnicos de carreira do Tribunal de Contas de Mato Grosso, apontando as irregularidades nas prestações de contas do Estado e dos municípios e me vem à mente o resultado final das votações no Pleno pelos conselheiros: aprovadas as contas com ressalvas! Ressalvas em contas públicas? Que serão votadas em Câmaras de Vereadores? Vereadores que sequer conhecem de contabilidade pública e o que votam?
E me vem à mente iniciativas do próprio TCE em promover a transparência. Transparência por quem? De que forma? Transparência para quem e por quê?

Não posso deixar de trazer à memória um fato memorável do próprio TCE: decretar que os recursos do IRRF que saem do salário do servidor público e ficam, no mínimo, um ano à disposição do governo para aplicação financeira, seja considerado um mero evento contábil. Mais de R$ 50 milhões são retirados do orçamento da Educação por ano, por serem considerados evento meramente contábil? E quando aqueles que têm direito à restituição recebem de volta seu dinheiro corrigido, de onde são retirados os recursos para a devolução? De onde saem esse dinheiro é também um evento meramente contábil?

Minhas reflexões acabaram por me levar ao encontro de uma tese já defendida por muitos: a de que os Tribunais de Contas, na forma como estão estabelecidos, de como nomeiam seus conselheiros, da pouca influência no resultado final das contas que quase sempre são acompanhadas de ressalvas, mas nem sempre rejeitadas pelas Câmaras de Vereadores, deveriam ser extintos. Ou no mínimo que seus conselheiros fossem escolhidos democraticamente pelo povo. Com certeza esse seria um grande passo no esforço da sociedade de superar administrações fraudulentas. Afinal, nada melhor quando se cobra austeridade, do que ser austero consigo mesmo!
Só lamento que o novo (na idade) já seja eivado pelo crivo do que é compreendido por muitos como “velho” e “atrasado” na história da administração pública brasileira.

Gilmar Soares Ferreira é professor de História da rede pública estadual de ensino e presidente do Sintep/MT.

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