Pensar o Paralelo 13° como fronteira discursiva, ou seja, fronteira que instaura um novo discurso, possibilitou escrever e publicar este livro – Fronteira discursiva: o paralelo 13° e os sentidos da exclusão – através da Editora da UNEMAT (Universidade Estadual de Mato Grosso) como resultado de dissertação de mestrado desenvolvida no Instituto de Linguagem da Universidade Estadual de Campinas IEL/ UNICAMP.
O interesse por esse tema se deve à minha observação, enquanto moradora e pesquisadora das questões da linguagem, do permanente estado de confronto dos habitantes da região norte de Mato Grosso em suas relações com o Estado, sob o impacto de Medidas Provisórias, projetos e punições ficais que incidem sobre a região.
Através desta análise observo as relações político-jurídico-ambientais e econômicas postas pelos discursos da região norte mato-grossense no que diz respeito à oposição desmatar/preservar.
Assim, em um gesto de interpretação em que procuro compreender como os sentidos são produzidos e circulam, observo causas e conseqüências que levam essa população a se sentir injustiçada e interditada ao ser excluída do contexto de desenvolvimento no qual estava inserida nas décadas de 70 e 80 e submetida a um espaço de restrições criado e controlado por medidas governamentais em que o Estado exerce o controle através de Medidas Provisórias.
O componente de maior alcance que norteou as entrevistas foi a Medida Provisória n°. 1511 de 27 de junho de 1996, que normatiza a obrigatoriedade da reserva legal nas propriedades ao norte do Paralelo 13° em 80%, contrário do restante do País em que a reserva legal obrigatória, à época da pesquisa, se definia em 20%.
Vejamos o artigo de lei que “dispõe sobre a proibição do incremento da conversão de áreas florestais em agrícolas na região Norte e na parte Norte da região Centro-Oeste – § 2° Nas propriedades onde a cobertura arbórea se constitui de fitofisionomias florestais, não será admitido o corte raso em pelo menos oitenta por cento dessas tipologias florestais”.
Esta Medida Provisória impõe uma fronteira discursiva – O PARALELO 13° – que estabelece, para os habitantes da região, os sentidos do “aquele que não pode” (desmatar, abrir a terra, plantar, gerar empregos, sobreviver da terra, enfim, gerar desenvolvimento), em oposição aos sentidos de “aquele que pode”, (desmatar, abrir a terra, plantar, gerar empregos, sobreviver da terra, enfim, estar inserido em um processo de desenvolvimento) atribuído aos habitantes ao sul do paralelo 13°.
Fronteira jurídica, visível e discursiva que inclui esta região em um discurso de preservação da Amazônia e estabelece os sentidos da exclusão, trazendo a afirmação “agora não posso mais trabalhar”.
A força das medidas preservacionistas desautoriza e impede que se atualize o dizer “eu vim autorizado a abrir a terra” pelos migrantes. Encontra-se aí, a meu ver, um dos motivos causadores do sentimento de injustiça e interdição e a convicção de estar com a “razão”: estes habitantes foram “convidados” pelas propostas governamentais de colonização da região a desbravar para gerar riquezas, aumentar a produção e integração ao desenvolvimento nacional.
Assim, entre a década de 60 e os dias de hoje, temos a mesma política governamental – que se utiliza da “questão amazônia” para gerar recursos e trabalhar a questão da soberania.
Concluo essa pesquisa afirmando que a Região Amazônica é usada como argumento na década de 60 através do slogan do próprio governo “Integrar para não entregar”, em que a Amazônia deveria se integrar aos moldes do desenvolvimento brasileiro para produzir riquezas e manter a soberania frente a interesses internacionais de torná-la reserva mundial de valor.
E a Região Amazônica continua sendo usada como argumento, agora com um deslocamento de sentidos no slogan “Integrar para não entregar” em que integrar, agora, para o discurso governamental, significa integração aos sentidos da globalização que prioriza questões ambientais e de preservação da floresta Amazônica para continuar tendo aval para empréstimos internacionais e manter a soberania territorial.
Assim, o discurso governamental estatal capitalista tem um só objetivo: usar a questão Amazônia para conseguir empréstimos internacionais:
1- Seja deslocando migrantes para a Amazônia para integrá-la ao desenvolvimento brasileiro na década de 60,
2- Seja filiando-se ao atual discurso ambientalista da globalização de preservação da região, silenciando o povo que a habita e as propostas desenvolvimentistas da década de 60.
O governo acompanha os argumentos imediatos da preservação para, no jogo entre o “global” e o “estatal”, manter a soberania.
Tânia Pitombo de Oliveira Letras é professora na UNEMAT Sinop e doutoranda em Lingüística pelo IEL/UNICAMP