Todo e qualquer esforço humano dispensa energia, sobretudo amar, trabalhar e lutar, é natural, pois são atividades de intensa necessidade de sinergia entre as pessoas envolvidas.
As pessoas podem cansar de amar, trabalhar e lutar, mas se acreditam na idéia que aquilo vale a pena fazer, assim que se recuperam, continuam a desenvolver suas atividades, entretanto não voltaram se o que realmente estiver cansativo não for a pessoa, mas a idéia.
Da mesma forma que a pessoa necessita da idéia para acreditar e voltar a tentar que ela se realize, a idéia necessita destas pessoas para sobreviver, idéia sem pessoas é teoria sem prática.
O que pode ser incansável não são as pessoas, nem as idéias, pois uns cansam para lutar, outros cansam de lutar, alguns lutam cansados, e sim o ideal. A conjugação da pessoa com a idéia, a personificação da idéia com a idealização da pessoa é o ideal.
O que falta não são idéias nem pessoas, mas esta idealização personificada. Não acreditamos mais uns nos outros e assim não achamos a pessoa ideal, as idéias sofrem por esta falta da personificação.As pessoas com idéias cansam pela falta de confiabilidade no resultado pretendido, as idéias com pessoas cansam pela falta de confiança na pretensão do resultado.
A idéia personificada não cansa, luta, luta e luta mais, até a vitória como resultado.
A desconfiança que atrapalha é em razão da autopersonificação. Pessoas acreditam por si só que podem se transformar em idéias, sem verdadeiramente acreditá-las, e idéias verdadeiras acabam sendo acreditadas em pessoas falsas. A verdadeira personificação é histórica e institucional.
O cansaço causado pela desconfiança é fruto das instituições distorcerem seus fins como um motorista de uma tortuosa estrada sem certo fim. As instituições deveriam guiar-se como carros em uma rodovia: transitarem em um espaço delimitado das competências como as margens do acostamento, numa velocidade controlada para que a pressa não atrapalhe no reflexo da reação institucional, ultrapassar as outras instituições nos casos já determinados como possíveis como em linhas pontilhadas, tudo para ter a certa possibilidade de que seguindo a estrada conforme as regras será possível atingir o final do caminho, ou seja, o fim institucional. È simples assim, como entender que um gestor público errado em suas intenções causará danos como um acidente de trânsito provavelmente será causado por um motorista bêbado.
Vamos aos exemplos práticos. O Ministério Público fazendo campanha contra queimadas, enquanto procedimentos administrativos investigatórios relacionados à educação, prioridade de qualquer Estado Moderno, ficam sem qualquer tipo de resposta efetiva.
O Poder Judiciário incentivando a adoção numa campanha concomitante com a novela das 8 para reaver a falta de proximidade com a população, enquanto processos ainda são organizados nas escrivanias sem qualquer método que considere a experiência cotidiana e a tecnologia atual, mesmo após séculos de repetição dos mesmos erros.
O Congresso preparando para votar a favor da lotação permanente dos servidores cedidos nos órgãos cessionários para que servidores cedidos provisoriamente atendendo o interesse político possam exercê-lo de forma permanente, e efetivar milhares de servidores contratados, enquanto o concurso público torna-se referência para sociedade como algo igualitário.
A OAB/MT execrando juízes que condenam criminosos em favor de criminais advogados, e não fiscaliza escritórios de advocacia conjugados com escritórios de contabilidade, profissionais que divulgam propaganda em jornais, pedidos de justiça gratuita sendo analisados pelo direto do fórum e não pelo juiz da causa, e mandados de segurança não sendo gratuitos na Justiça estadual conforme dispõe a Constituição Estadual.
O Poder Executivo intenta cada vez mais desvincular a suas receitas para obter mais margem livre para gastar cada vez mais em publicidade e menos, exemplificando, em assistência social. Gastar mais com as atividades meios do que com as atividades fins, alías para mim isto é de utilidade igual a ter armário em casa para guardar potes plásticos vazios que nunca serão usados, é inócuo.
No meio do percurso, conforme o gosto de quem cabe a gestão, muda-se o caminho. O mérito, até certo ponto de vista da questão pode ser louvável, mas a estrada não previa este desvio.
A hipocrisia governamental na sociedade da informação reside em fazer algo constitucionalmente não previsto como institucional para projetar a informação para a parcela da sociedade não esclarecida que está a fazer algo útil, com intuito de garantir uma boa imagem da instituição. O fim constitucional-institucional desvirtua-se para finalidade do gestor da instituição É exatamente este, o liame que separa a discricionariedade arbitrária da necessária vinculação das competências constitucionais.
O poder no Brasil continuará sendo atrativo às pessoas erradamente intencionadas, fundamentalmente, em razão não da possibilidade de fazer o que quer abertamente, mas de ter a possibilidade de fazer a abertura do que quer fazer.
Então o que cansa é ver o caminho constitucional dos fins institucionais ser constantemente mudar de traçado no meio do transcurso da viagem como um motorista que não segue o rumo inicialmente traçado.
O gestor sabe que as montanhas dos grandes problemas solucionados em longo prazo poderão ser transpostas por engenhosos atalhos de soluções instantâneas facilitadores de projeção de imagem de instituição útil, mas a informação que fica é que a utilidade não é da sociedade e sim da própria instituição.
Na democracia o que prepondera é a possibilidade de optar. A todos que estão inseridos em um processo democrático é dado a oportunidade de optar entre as possibilidades, ou até mesmo apresentarem novas possibilidades para a opção. Assim em um Estado Democrático as opções devem ser feitas por todos, acredito que não erramos nas idéias constitucionais, erramos sim, em permitir que pessoas se autopersonifiquem e falsifiquem estas idéias. Não serei vencido pelo cansaço desta viagem de linhas tortas, pois acredito na idéia da reação e então trilharemos pelo verdadeiro caminho idealizado.
Bruno J.R. Boaventura – especialista em Direito do Estado, advogado militante em direito público.