A concordância foge a norma da língua pátria, seria desculpe-me, mas o velho gaúcho ao proferir tão exígua frase, ao contrario de sua índole, entregava os “pontos”, contrariando a tertúlia “não podemo si entrega pros home, de jeito nenhum, amigo e companheiro. Não ta morto quem luta e quem peleia, pois lutar é a marca do campeiro”. Eu que ando estudando um pouco as ciências jurídicas, e nem gaúcho sou, senti um golpe de morte, tipo facada no peito, daquelas que nem dá tempo de gritar, ao ver aquele desconhecido, vermelho igual pimenta madura, tanto por sua origem quanto pelo sol sinopense de verão e ainda pela tensão aparente, com sinais de pressão arterial acima de qualquer nível tolerável. Estava á beira de um derrame cerebral ou infarto.
Esse golpe, não apenas a mim atinge, mas diretamente a nossa carta Magna, a Constituição Federal, vigente desde 1988, que traz logo em seu inicio, no famoso artigo 5º, que inversamente determina, no inciso LXI “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei’’ e no inciso LVII “ninguém será considerado culpado até o transito em julgado de sentença penal condenatória”. O que isso quer dizer?
Talvez para muitos de nos, quase nada, mas o velho gaúcho acima citado, parecia correr contra o tempo, pois lhe haviam avisado que um filho seu estava preso, numa dessas “guilhotinas” da vida, que agora não passam um mês sem aparecer por aqui.
Que crime pode ter cometido?
Provavelmente, um daqueles delegados ou promotores meninos com cara de heróis sabe tudo, (meninos porque são muito novos, sabe tudo porque pensam que sabem tudo), logo dirá em entrevista coletiva em rede nacional e internacional, que são “prisões de criminosos ambientais, que retiraram da floresta algumas mil carretas de madeira extraídas ilegalmente de algum lugar incerto e não sabido, avaliadas em outros tantos milhões e que estaria decretada a prisão provisória daqueles “meliantes” por cinco dias para averiguações com possibilidade de prorrogação por período suficiente que não interferisse nas investigações” e por aí.
Tomo o lugar de meu personagem para lembrar que nem na era “Geisel” se prendeu tanto e tão arbitrariamente para “averiguações” como o que está ocorrendo agora em nossa região. A troco do que?
Parafraseando um ilustre professor de sociologia por quem tenho grande apreço, “Pior que não conhecer a historia, e inventar estória”.
Não se preocupem, ao final me identifico e se quiserem, prendam-me também, por dizer a verdade.
As pessoas que estão sendo sistematicamente presas em nossa região, com raríssimas exceções, não passam de visionários que acreditaram em um programa de governo serio, de desbravamento da região amazônica, onde havia bom clima, terras baratas (ou oferecidas pelo governo gratuitamente), madeira em abundancia e acima de tudo, precisava ser integrada ao território nacional, pois era carente de gente.
Centenas de pessoas deixaram parte de suas famílias e abandonaram suas terras natais, para constituir novos lares no meio da floresta, sem qualquer recurso que não fosse a fé em DEUS e em seus sonhos.
Isso remonta há menos de trinta anos e agora são criminosos, filmados e anunciados em rede nacional e internacional, tanto quanto qualquer traficante de arma e/ou drogas nos morros cariocas. Extrair a madeira e formar gigantescas e produtivas áreas de lavoura ou pastagem é o crime que cometeram? Claro que não. Essa foi sua missão, foi para isso que pra cá vieram e se são trabalhadores e competentes, jamais podem ser crucificados e expostos de forma vil como está ocorrendo. A consciência ambiental de forma unilateral como vem sendo imposta pelo lado desenvolvido, dentro e fora de nosso país é impraticável, ou você, autoridade ambientalista de plantão já se perguntou o quanto polui seu ar condicionado, que por certo não é só um, ou seu (s) carros, suas baterias de celular? De repente, a casa ou apartamento onde você mora, está tomando o lugar de varias árvores ou quem sabe, até de uma nascente que poderia estar ajudando a formar um riacho, por onde deslizaria seu esgoto.
Parem com isso. Se há problemas globais de aquecimento, buraco na camada de ozônio, tsunamis, derretimento das geleiras, enfim, inúmeros problemas, não será a ofensiva armada e arbitraria contra trabalhadores de nossa região que vai resolver. Precisamos evoluir em técnicas, legislação e ações positivas que minimizem as questões ambientais, mas não aceitaremos ser o bode expiatório da questão. Jamais fomos ou somos criminosos que precisem ser coercitivamente conduzidos a presença de uma autoridade policial ou judicial para prestar esclarecimentos (na ditadura, averiguações). Se quer sabemos direito em que égide jurídica estamos vivendo, face ao derrame de atos e portarias que criam e modificam normas todos os dias.
Já passou da hora de se promover um debate de idéias e ações acerca de nossas reais possibilidades de desenvolvimento e contribuição para, ao mesmo tempo melhorar nossa condição regional e auxiliar na minimização dos problemas ambientais.
Chega de policia e operações.
Policia para quem precisa de policia (titãs).
Valdir Favareto – acadêmico de Direito.