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Greve esquisofrênica

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De forma semelhante ao que ocorre com diversos colegas docentes da UFMT, já estou vivendo o entardecer do meu percurso profissional. Já participei de várias greves aqui e em outras instituições nas quais trabalhei. Portanto, a minha percepção do direito de greve não está ancorada apenas nas recentes paralisações ocorridas na UFMT, mas em outros tempos e em outros espaços. Foi aqui, porém, que conheci essa modalidade de “adiamento do calendário letivo da graduação” a que se convencionou chamar de greve, pseudo-greve, meia-greve, quase-greve e que, na sociedade, é percebida como uma “palhaçada”, “molecagem” ou “férias prolongadas”.
Hoje quero propor a essa modalidade de greve um novo atributo: o de uma manifestação esquizofrênica. Ela nos induz a uma situação semelhante a daquele sujeito que se sabe um maluco, mas que se diz um Napoleão. Vejamos, pois, a loucura de um dia de greve!

Iniciamos a nossa manhã-de-greve paralisando as atividades no ensino de graduação, alegando motivações salariais, melhoria da qualidade do ensino, essas coisas.
Já à tarde, retornamos com as atividades normais no ensino de pós-graduação argumentando que a greve afetaria o conceito do Programa, prejudicaria a instituição, resultaria na redução de bolsas e assim por diante… Portanto, somos obrigados a trabalhar à tarde por razões semelhantes àquelas que justificaram a suspensão das atividades matutinas.
À noite mantemos regularmente os cursos de especialização porque, afinal, são “pagos” e funcionam como uma complementação salarial. Além disso, alguns desses caça-níqueis (semelhante ao que ocorre com os bingos) já foram assimilados pela sociedade como um período de entretenimento ou como uma forma de angariar algum ganho intelectual ou financeiro. O argumento de que devemos mantê-los porque a sociedade exige ou porque o nosso salário é baixo, não parece uma justificativa suficiente para burlar a greve.

O nosso dia-de-greve continua com a manutenção das atividades de pesquisa e de administração, estas, com argumentos igualmente contraditórios uma vez que consideramos que os nossos cronogramas de pesquisa e a manutenção dos serviços que garantem a nossa remuneração são mais legítimos do que o direito dos estudantes concluírem os seus cursos no tempo adequado.
São essas e outras contradições que comprometem a coerência das nossas greves uma vez que lhes conferem múltiplas identidades contrastivas.
A verdade que agora aparece clara para nós e para a sociedade é que essas “greves” esquizofrênicas penalizam duramente o segmento mais fragilizado da universidade, o “primo pobre”, o ensino de graduação. Os programas de mestrado, as atividades subsidiadas, os cursos “pagos” etc. continuam funcionando como sempre, normal e solenemente.

Esse modelo de greve tem sido praticado e defendido no nosso sindicato com o discurso enganoso de que trata-se “do mais legítimo direito democrático” e que a nossa greve é “inspirada na luta histórica dos trabalhadores ingleses”, etc. etc. etc.
Ora, convenhamos! Essa cantilena não pode ser levada a sério pelos docentes e pela sociedade. Trata-se de um discurso oco, falso, destituído de fundamentos na realidade. Seu eco limita-se aos nossos ouvidos, acostumados com a falseta da nossa própria voz.
Mais uma vez estamos diante de uma proposta de greve, de uma falácia, de uma enganação, de um tiro no pé. Os seus contornos e os seus sintomas identificam um sindicalismo esquizofrênico, decadente e desacreditado. Portanto, para o bem da categoria e da sociedade, digamos um NÃO à greve na UFMT!

Darci Secchi é professor doutor da UFMT

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