Envergonha-me profundamente a decisão da Câmara dos Deputados de absolver o deputado Romeu Queiroz (PTB-MG), acusado de se beneficiar do mensalão. O deputado pode ser bem relacionado, pode ser humilde e bom companheiro. Mas havia provas e documentos e ele reconheceu que recebeu 450 mil reais do tesoureiro do PT, por recomendação do deputado Roberto Jefferson. Por isso tinha de ser cassado.
Foram 250 votos contra a punição e apenas 162 favoráveis à perda do mandato. O resultado mostra que houve um grande acórdão na Câmara, entre o PT e seus aliados à direita, o PTB, o PL e o PP, que resultou no perdão do deputado mineiro.
Como diz o velho ditado popular, quem faz um cesto, faz um cento. A Câmara, que já havia absolvido o líder do PL, Sandro Mabel, agora perdoa um representante do PTB. Nos próximos dias, deverão ser absolvidos também representantes do PT e do PP. No final das contas, os acusados sairão contentes, aliviados, e a opinião pública, mais uma vez, ficará com cara de boba.
A compra de votos, que deveria ser considerado crime hediondo contra a moralidade pública e a boa prática política, agora está sendo perdoada. A Câmara dos Deputados, ao absolver Queiroz, disse ao Brasil que agora vale tudo. Não há mais limites éticos ou morais na política.Caixa dois, mensalão, compra de votos, tudo pode. Plagiando os versos do grande poeta Fernando Pessoa, em política tudo vale a pena, se a grana não é pequena.
O PT, que inventou o mensalão para comprar deputados e que transformou o caixa dois numa prática comum de campanha, agora está criando o rodízio de pizza na Câmara dos Deputados. Está aberto o caminho para o perdão a todos os demais mensalistas e para a anistia política para José Dirceu e Roberto Jefferson.
Haverá pizza de todos os sabores. Com estrelas, para os deputados do PT. Com bandeirinhas, para o PTB, e colorida para os mensalistas do PP. Para o povo brasileiro, a Câmara dará uma banana. Literalmente!
É um péssimo exemplo. A Câmara dos Deputados está mostrando ao Brasil como devem ser tratados os corruptos. É o elogio ao crime, o incentivo à contravenção, que não seria possível se o governo federal não estivesse de acordo. Mas o governo concorda com isso. O governo do PT trabalhou para isso. O governo e seu partido, que eram os paladinos da ética e da moralidade, agora chafurdam na lama da corrupção. Parecem felizes.
O perdão aos deputados mensalistas é a contribuição mais importante do PT e do governo Lula para o aperfeiçoamento da democracia e para a moralidade de nossa política. Já que a reforma política não saiu do papel, já que não se levaram adiante propostas de mudanças na lei eleitoral, já que ninguém foi preso até agora por conta do mensalão e do caixa dois, não há porque punir os deputados. Porque só eles? Devemos ser justos.
Agora a sociedade brasileira está conhecendo a fundo a democracia implantada pelo PT. Vivendo e aprendendo. Já tínhamos visto a democracia sem eleição nos governos militares. Experimentamos a democracia relativa do ex-presidente Geisel e a democracia sem adjetivos da Nova República. Agora, conhecemos a democracia sem vergonha do PT e de Lula.
No Brasil que Lula pensa existir, caixa dois não é crime, o mensalão não existe, as denuncias contra autoridades são sempre infundadas e as dívidas não são cobradas. As promessas nunca são cumpridas. Os mensalistas são inocentes, mas os suspeitos são culpados até prova em contrário. As elites conspiram e as oposições são golpistas. Quem faz as leis julga-se no direito de não cumpri-las. Quem deveria aplicá-las, prefere ignorá-las em prol de interesses menores. E tudo sempre fica por isso mesmo.
Neste Brasil de Lula, a lei não é para todos, mas os amigos e aliados têm direito à pizza. Pode até parecer engraçado, mas é retrocesso político. Democracia não pode ser confundida com impunidade e com tolerância com o crime. É lamentável o que aconteceu na Câmara. Caso se repita, pode ser trágico para a democracia e para o Congresso.
Antero Paes de Barros é radialista, jornalista, senador e presidente do PSDB-MT
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