Em julho de 2004, o Presidente Lula, acompanhado pelo Governador de Mato Grosso do Sul, foi a Santa Cruz de la Sierra para se encontrar com o Presidente da Bolívia. Entre outros temas da agenda, perdoou uma dívida de U$50,00 milhões dos bolivianos e disponibilizou no BNDES, U$600,00 milhões para os bolivianos investirem em infra-estrutura de transportes e energia dentro da Bolívia. Com uma parcela destes recursos financeiros estão construindo um trecho da estrada de Santa Cruz la Sierra para Corumbá, Mato Grosso do Sul. No mês seguinte, foi à Brasilea, no Acre, na fronteira da Bolívia com o Brasil, para inaugurar uma ponte sobre o Rio Acre, ligando a Capital do Departamento de Pando, Cobija a este Estado brasileiro. Em seguida, embarcou em um helicóptero, foi para Assis Brasil, na fronteira do Brasil com o Peru, também no Estado do Acre e lançou a pedra fundamental para a construção de outra ponte, também sobre o Rio Acre, a ser inaugurada ainda este ano, ligando Assis Brasil à Iñapari, no Departamento de Madre de Dios. Tudo isto, acompanhado naturalmente pelo Governador do Estado do Acre. Coincidência ou não, ambos os Governadores são do PT.
Ainda em fevereiro de 2004, por recomendação do Ministério dos Transportes, cujo Secretário Executivo era Secretário de Estado do Governo de Mato Grosso do Sul, técnicos da Valec, empresa brasileira especializada em transporte ferroviário, fizeram um estudo das condições da ligação ferroviária Santos Antofagasta, Chile, com extensão de 4.300 km. A conclusão a que se chegou é que seriam necessários U$430,00 milhões para efetuar os melhoramentos no trecho brasileiro de Santos à Corumbá; no trecho de Santa Cruz de la Sierra à Salta na Argentina, e no trecho de Salta à Antofagasta, principalmente na travessia da cordilheira em Socompa, na fronteira da Argentina com o Chile. O trecho de Corumbá à Santa Cruz de la Sierra é o que apresentou as melhores condições de transporte, não necessitando de reparos.
No mês passado o Presidente voltou ao Acre para lançar o início da construção do trecho de 900 km da Estrada do Pacífico que ligará o Brasil, via Estado do Acre, numa distância total de 1300 km, da fronteira Brasil/Peru aos portos peruanos de Ilo e Matarani, cruzando a Macro Região Sul do Peru, cujos recursos de U$700,00 milhões serão disponibilizados através do BNDES.
Nada contra o Brasil investir na Bolívia e em outros países sul-americanos, se almejamos a integração continental. Sobretudo agora que a diplomacia brasileira inseriu na agenda internacional do Itamaraty a Integração física da América do Sul. Como País de maior desenvolvimento econômico relativo do continente, deve recair sobre si também maior responsabilidade na condução do processo desta integração. Entretanto há que se levar em conta que esta integração tem por base a instalação de novas rotas de comércio intra-regionais que serão estabelecidas naturalmente pelo próprio mercado, cuja lógica é a do menor custo dos produtos no destino final. Não se pode conceber que para exportar de Mato Grosso para os países andinos, por via rodoviária asfaltada, tenha-se que passar por Corumbá, distante 1100 km de Cuiabá, ou por Rio Branco no Acre, distante 2000 km, se pode fazê-la cruzando a Bolívia via Cáceres e Santa Cruz de la Sierra até a costa do pacifico numa distância máxima de 2400 km.
Todos estes projetos rodoviários estão contemplados na Iniciativa IIRSA – Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana, assim como, a conclusão asfáltica de 432 km da ligação de Cuiabá com Santa Cruz de la Sierra, via Cáceres San Matias, que nos possibilitará chegar por estrada asfaltada ao norte da Argentina, ao norte do Chile e ao sul do Peru. Diga-se de passagem, esta alternativa se constitui em um dos projetos prioritários da Bolívia, apresentado no Seminário BNDES CAF, realizado no Rio de Janeiro, em agosto de 2003. Entretanto, o Estado de Mato Grosso, maior exportador da região centro oeste e o décimo maior Estado exportador do Brasil, que dispõe do maior volume de produtos disponíveis para exportação, principalmente produtos alimentares, na região centro oeste e na região amazônica, está sendo preterido, ou como que contornado, ou melhor, a conclusão do asfalto dentro da Bolívia esta sendo postergada. Algo semelhante ao que países sul-americanos estão pensando em fazer com o gás natural de Camisea, situado no Departamento de Madre de Dios, Peru: construir um gasoduto passando pelo norte do Chile até Antofagasta, daí se infletindo para leste passando por Salta, na Argentina e finalmente para o sul do Brasil. Em resumo contornar a Bolívia.
A integração sul-americana é um processo irreversível. O grande desafio agora é saber qual a melhor forma de atuar para construí-la, levando em conta os novos paradigmas do desenvolvimento, que devem estar livres de interesses promocionais de qualquer natureza. Como diz Eugenio Bucá, eles devem estar comprometidos com uma só causa, a da integração, e por integração deve-se entender a aproximação horizontal entre sujeitos sociais de nacionalidades distintas, que partilhem de projetos comuns num ambiente de pluralidade.
* Presidente do Sindicato das Indústrias de Extração do Calcário do Estado de Mato Grosso (Sinecal) – coordenador das Ações da Carta de Cuiabá para a Integração e do Conselho de Integração Internacional da FIEMT
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