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O Brasil depois do Referendo

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Serenados os ânimos pós-propaganda eleitoral, com a vitória do NÃO no referendo sobre a proibição da comercialização de armas e munição, muitas lições podem ser tiradas.
O povo demonstrou-se capaz de ir às urnas, soberanamente, e tomar decisões importantes sobre os rumos do país. Mas podemos questionar o nível de consciência de cada um sobre a decisão tomada e, se faltou voto consciente, a culpa não é do povo, mas dos dois programas gratuitos na televisão. Nenhum deles foi capaz de mostrar, com clareza, o que estava em jogo. O tensionamento apaixonado na TV encobriu verdades que precisavam ser reveladas: quem ganha dinheiro com o comércio de armas; o que pensam os operários empregados nas fábricas e nas lojas de venda de armas e munição; qual é a classe social que mais morre vitimada pelas armas de fogo; o direito de defesa em abstrato, ou seja, direito que não serve para ninguém, exceto, para aqueles que podem comprar uma arma – e olhe lá!; qual é o número exato de pessoas portadoras de armas que conseguiram se defender de assaltantes? Tudo isso foi escondido ou, pelo menos, não discutido de forma esclarecedora para o senso comum. Enfim, um conjunto de inverdades que faz lembrar aquela triste imagem da campanha presidencialista na qual o sujeito vinha e tomava o título de eleitor das mãos do cidadão como se, no parlamentarismo, lhe fosse negado o direito de votar. Quem tem acesso à internet viu melhor o debate, mas o povo não teve acesso à verdade, assim como não terá acesso a este artigo.

Nos bairros mais violentos de São Paulo, de população mais pobre, ganhou o SIM; nas classes médias e altas ganhou o NÃO. Em Diadema e em bairros onde a presença do poder público se faz presente, com modelos novos de segurança, também ganhou o SIM. E de modo geral, em todo o Brasil é possível concluir que o resultado é tipicamente um voto de classe média fortalecido pela precária consciência dos mais pobres – que continuarão sendo as vítimas.

A partir do referendo, o Brasil continuará com dois contingentes de pessoas armadas: o legal e o ilegal. As fábricas e o comércio de armamento ficaram felizes e, em conseqüência, teremos mais fabricação, mais armas circulando e o aumento das mortes por esse instrumento. Podem anotar: no próximo ano o número de vítimas de arma de fogo será maior que em 2005 e, com certeza absoluta, morrerão os mais pobres.
Outra lição da vitória do NÃO é a de que há um sentimento generalizado de descrença da população na capacidade do Estado Democrático em oferecer segurança para aqueles que financiam a segurança através de impostos. E, justiça seja feita, há poucos políticos como o Governador Blairo Maggi com a coragem de dizer que não é possível ao Estado colocar um policial armado em cada boteco ou em cada propriedade rural que tem os seus depósitos de agrotóxicos. Se todos os governadores escancarassem esta verdade, o foco do debate seria outro. Ao invés de discutirmos quem deve ou não possuir uma arma, estaríamos discutindo como financiar uma segurança para todos que, a rigor, custa mais que o dobro do que se investe hoje.

A quem interessa a violência? Ora, assim como há uma indústria da seca, montada para ganhar dinheiro sobre a tragédia da estiagem no nordeste, há uma indústria da violência. Ou seja, há muitos setores da sociedade que ganham dinheiro com a violência. Muitos programas de rádio e TV, jornais, empresas de segurança, fábrica e lojas de armas, todo esse complexo minimizaria o lucro se a violência deixasse de existir. Portanto, estamos longe de construir um mundo de paz.
Considerando que 98% da população brasileira é religiosa e, a rigor, deveria defender um mundo de paz, há que se reconhecer que as igrejas não têm força diante dos meios de comunicação.

Precisamos estar vigilantes porque o próximo passo da “bancada da bala” no Congresso Nacional será flexibilizar o estatuto do desarmamento para que armas possam ser adquiridas com mais facilidade.
Isso posto, cabe respeitar o que o povo decidiu e lutar para que outras consultas populares sejam precedidas de debates com base na verdade.

Antonio Carlos Maximo é doutor em educação e Professor da UFMT.

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