A família de um homem que morreu, em abril deste ano, entrou com uma ação na 6ª Vara Cível para que o corpo, enterrado no cemitério municipal de Sinop, seja exumado. O homem faleceu em um hospital de Tangará da Serra, após se curar da covid, mas a família alega que não pôde identificar o corpo e que “pairam dúvidas” sobre a identidade da pessoa que está enterrada no jazigo, além da real causa da morte do familiar.
Segundo relatado na ação, o morador foi internado em um hospital particular no dia 1º de março e que, até o dia 6, manteve contatos telefônicos com a esposa e filhos. A partir de então, com o agravamento do quadro de saúde, a família foi informada de que o paciente deveria ser transferido para um hospital em Tangará da Serra, já que não havia UTIs disponíveis na rede particular de Sinop naquele momento.
A esposa detalhou que, desde a transferência, no dia 6 de março, até o óbito, no dia 20 de abril, só recebeu boletins diários e não foram repassadas quaisquer informações extras e nem permitido contato por telefone com o paciente. Segundo ela, no dia 30 de março, o marido teve uma melhora no quadro e foi declarado curado da covid-19. Naquele momento, de acordo com a esposa, “nada impedia que o paciente fizesse contato com a família, pois estava acordado e comunicativo”.
Ainda assim, segundo a família, o homem foi mantido na UTI, o que impossibilitava as visitas, “inclusive por videoconferência”. A família então procurou a Defensoria Pública, que enviou um ofício ao hospital. Conforme relatado na ação, apenas no dia 19 de abril foi autorizada a videochamada, mas “sem sucesso, diante do agravamento da hidrocefalia, e consequente parada cardiorrespiratória, e morte na madrugada”.
De acordo com a família, o hospital informou que, dois dias após ser declarado curado da covid, o homem teve piora no quadro, apresentou crises convulsivas e foi diagnosticado com um tumor cerebral, que não tinha relação com a doença infecciosa, e consequente hidrocefalia (edema/inchaço). Na ocasião, a equipe decidiu fazer uma cirurgia de urgência para descompressão, segundo as informações prestadas para os familiares.
A família afirma, porém, que não há certeza sobre quem está enterrado no jazigo porque ocorreram “diversos erros de procedimentos, como impedimento de visitação por mais de 45 dias mesmo o paciente estando curado da covid-19, falta de informações precisas, vedação de identificação do corpo conforme normativa da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), erros apresentados no boletim de óbito com discrepância explícita da data da morte e causa da morte inconsistente com laudos apresentados”.
Na ação, a família acionou o município de Sinop para que fosse autorizado o reconhecimento do corpo, “sendo por características físicas ou através de exame de DNA”. Caso seja confirmada a identidade, o pedido era para “diagnosticar a real causa da morte, para o restabelecimento da ordem e do direito cerceado desta família”.
Ao analisar o caso, o juiz Mirko Vincenzo Giannotte, declinou da competência para julgar a ação. “O pedido pleiteado não se refere a interesse da Fazenda Municipal, sendo, na verdade, relativo a direito da personalidade das requerentes, notadamente o seu interesse moral, em ver dirimida dúvida que atormenta a família, em razão dos fatos que cercaram a morte, em relação à identidade do corpo sepultado como sendo, ou não, o do esposo/pai falecido, além da real causa da morte dele. Há que se considerar ainda que, o simples fato de o corpo ter sido sepultado em cemitério municipal não atrai a competência para a respectiva Vara da Fazenda Pública”, afirmou o magistrado.
Mirko também destacou que a ação não deve ser movida contra o município. “Por oportuno, cumpre esclarecer que embora as partes autoras tenham indicado o município no polo passivo, o procedimento de alvará judicial não admite mencionada indicação, havendo que ser desconsiderada, especialmente, porque não há interesse da municipalidade em relação ao pedido, tratando-se, como dito acima, de pedido relativo aos direitos da personalidade, de ordem privada. Cabe, portanto, o reconhecimento da competência ordinária do juízo cível, como a mais indicada para o conhecimento de pedido relativo aos direitos da personalidade das requerentes”.
Com a decisão, o caso será julgado por outra das Varas Cíveis de Sinop.