As concessionárias paulistanas que ficaram abertas no fim-de-semana venderam 2 mil veículos. Quase três vezes o que vinham vendendo nos sábados e domingos. Vendas sem entrada, em 60 prestações de 415 reais. Resultado dos incentivos que o governo deu para as montadoras desovarem seus estoques. Com pátios cheios, falava-se em paralisação da produção, férias coletivas e, à meia-voz, demissões. O Sindicato dos Metalúrgicos – do qual Lula é membro nato – mobilizou-se e não se descarta o dedo do ex-presidente nas medidas adotadas pelo governo: redução do IPI, dos juros, do Imposto sobre Operações financeiras e bancos oficiais ampliando prazos – tudo para acudir as montadoras.
Isso seria atual se estivéssemos no fim dos anos 50, com a política de incentivos à indústria automobilística, promovida pelo presidente Kubischeck, para estimular a industrialização do país e substituir as importações de veículos. Mas hoje parece loucura estimular o transporte individual. Na medida em que esvaziam os pátios das montadoras, aumentam o congestionamento urbano, onde já não há lugar para estacionar, nem mesmo nas cidades menores. Isso sem falar no crescimento da poluição – bem às vésperas da conferência do meio-ambiente Rio+20. Os produtores de álcool combustível estão preocupados, porque já não há combustível suficiente para os veículos existentes. É como uma pessoa obesa, avisada dos perigos da gordura, que se mete a comer mais e mais.
A falta de pagamento dos endividados por compra de automóvel preocupa e vão empurrar com a barriga, sem resolver o problema. Como aos bancos não interessa tomar os veículos, que já estão desvalorizados, e não há lugar para guardá-los, decidiram renegociar as dividas. Que vão aumentar, porque quem compra carro a 415 reais por mês por 60 meses, em geral não sabe quanto vai gastar de combustível, de multas, de oficina, de acidente, de IPVA, de bateria e pneus novos, isso sem contar as outras prestações que o consumismo desenfreado induz. Dando o passo maior que as pernas, corre-se o risco de rasgar as calças.
Os compradores de carro também são grandes pagadores de impostos. No preço de um carro, quase metade é imposto. E só a outra metade é o carro mesmo. Também no combustível vão pagar metade de imposto. Por isso que os carros custam o dobro aqui no Brasil. A busca pelo transporte individual é uma visão enganosa de que o comprador vai se livrar das agruras do transporte coletivo. Nas grandes cidades, apenas vai estar parado no mesmo congestionamento dentro de um carro e não dentro de um ônibus. Ou o Brasil constrói supervias, como Los Angeles, para poder ter muito carro, ou opta por um planejamento e investimento maciços em transporte urbano de massa, como metrô e ônibus articulado. Ou mobilidade urbana vai se chamar de paralisia urbana – do país burro que não planeja e tem como esporte favorito não o futebol, mas chegar atrasado quando a bola já está entrando no gol contra.