domingo, 22/setembro/2024
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Paes e pais

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O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, está provocando os cariocas. Deixou de lado os mitos da Cidade Maravilhosa e está jogando na cara de seus habitantes o baixo grau de civilidade que demonstram. Para mim, que viajo ao Rio no mínimo duas vezes por mês, isso não é surpresa. O Rio visto de longe, do avião ou do alto do Corcovado, ainda é a Cidade Maravilhosa. Um pouco mais abaixo, mas ainda acima do chão, começa a mostrar uma feia realidade. Em geral fico nos andares mais altos do hotel em que me hospedo, em Ipanema. De lá, do 20º andar, observo que o bairro, tido como o chique da cidade, é um imenso favelão. Prédios feios, com algumas exceções, encimados por entulho, telhados improvisados, caixas d"água sem tampa e piscinas abandonadas, a criar mosquitos.

Dormir de janela aberta, impossível. O barulho vara a noite. Gritarias nos bares e buzinas 24 horas por dia são um inferno. Isso que minha experiência é do bairro chique… Ir à praia, só para caminhar na calçada, com dificuldade por causa das bicicletas fora da ciclovia, gente a caminhar na contramão, grupos que param para conversar no meio e não na lateral. Barulho de vendedores ambulantes e ruído ensurdecedor do trânsito da Avenida Vieira Souto, também tida como chique. Não vejo encanto morar por ali, de janelões abertos para a praia, com o barulho entrando junto com a maresia… Caminhar pela areia é uma temeridade. Você pode pisar em caco ou cocô. Garrafas quebradas, papíes, sabugos, copos plásticos e cachorros emporcalham a praia. E a água do mar tampouco é amistosa, contaminada por coliformes fecais. João Saldanha, técnico da seleção brasileira, certa vez me confidenciou: "Faz 20 anos que eu não entro no mar por aqui. Sabe por quê? Está vendo lá naquela onda? É o cocô que fiz hoje de manhã".

Não vou falar das calçadas sujas, fedidas, servindo de camas para mendigos; as poças d"água, os carros invadindo a calçada para estacionar; muito menos do risco de assalto, das faixas de pedestre desrespeitadas. Quero falar do prefeito que teve a coragem de dizer tudo isso para os que o elegeram. Muita gente não gostou. Paes os chamou de "porcos". Foi fundo. Tratamento de choque necessário. Tudo isso é falta de civilidade; de cidadania. Que deveria ser uma questão de pais e não de Paes. Porque se deveria aprender em casa que a cidade é a extensão do nosso lar. Moramos na cidade. Deveríamos tratá-la como nossa morada. Limpinha, cheirosa, segura, bonita, organizada, sem barulho. As cidades civilizadas são assim e morar nelas dá muito prazer. Tudo funciona e nada perturba, porque cada morador-cidadão é responsável por ela. Isso vale para a maioria das cidades brasileiras.

Quando eu era menino, lembro-me do que meu avô me ensinava, quando via alguém arrancar uma folha de árvore da calçada. "A árvore não é da prefeitura; é nossa. Se todos arrancarem folhas, vão acabar a beleza e nossa sombra." A cidade não é do prefeito; é de cada um que vive nela. É uma questão de inteligência ser civilizado. Com atos de selvageria, inferniza-se a vida alheia e a própria vida. Tudo fica mais difícil. Por isso que a gente se sente tão bem quando viaja para o primeiro mundo e relaxa: sem barulho, sem sujeira, sem congestionamentos, sem ilegalidades. Tomara que Paes consiga o que pais não conseguiram.

 

 

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