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A porcaria da gripe

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Nunca vi, em toda a minha vida, os jornais  – impressos, falados e televisados –  ocuparem tanto espaço com uma doença como agora, como essa tal gripe suína. E faz dois meses que é o grande assunto. José Sarney agradece à gripe que tem  merecido mais espaço que o escândalo gerado pelas malfeitorias do presidente do Senado.
A tal  nova gripe já provocou queda da venda de produtos suínos, ainda que o porco nada tenha a ver com isso.  Uma injustiça para os suinocultores. E também causou cerca de 40 mortes no inverno nos estados do sul.  Quarenta mortes. Sabem quanto a gripe comum, não-suína, matou no ano passado? 70.142 pessoas, segundo estatísticas do Ministério da Saúde, que  devem ter deixado de somar muitas mortes por esse interiorzão em que não há registros de causa.  A gripe comum, que  ataca em geral os estados do sul no inverno, matou mais de 70 mil brasileiros o ano passado e não teve um milésimo da atenção, da preocupação das autoridades, muito menos espaço nos jornais e tempo no rádio e TV.
Não consigo entender tamanho disparate.  Por que, durante esses anos todos de dezenas de milhares de mortes, a cada ano, causadas pela gripe comum, não se deu a ela a importância que se dá à “gripe suína”?

No fim-de-semana, um avião da  Gol vindo de Brasília, ficou retido três horas no aeroporto de Recife, pela Anvisa, porque havia a bordo uma pessoa com sintomas que poderiam ser de gripe suína. Ao que me recordo, nesses anos todos que passaram, não tenho conhecimento  sequer que algum passageiro tenha sido impedido de embarcar por estar com gripe. E na cabine hermeticamente fechada do avião, em que o ar não é renovado, ficou a espirrar e a tossir, ameaçando contaminar todos os passageiros. E ninguém da  Anvisa apareceu para  impedir o contágio.

Não me recordo que os Ministérios da Saúde e da Educação tenham recomendado adiamento do reinício das aulas por causa de uma gripe que mata 70 mil por ano. Agora, por causa da "suína", que matou 40, tiram uma semana de aula das
crianças – sem qualquer efeito prático, a não ser piorar a situação de alunos carentes de preparo para enfrentar o mundo e a vida. Tampouco  recordo ter ouvido um  Ministro da Saúde recomendar que pessoas com baixas defesas, como idosos,  doentes, grávidas, evitem aglomeracão onde possam se contaminar. Uma recomendação que deveria ser permanente.

E o lavar as mãos? Por que só agora falam nesse ponto que é o mais básico da higiene? Como se sabe, as mãos são a parte mais suja do corpo humano.  É com elas que tocamos o mundo, apertamos outras mãos, tateamos, abrimos portas, torneiras, seguramos corrimãos, limpamos objetos, trabalhamos. Qualquer outra parte do corpo humano tem menos contato com sujeira que nossas mãos. E, no entanto, as autoridades de saúde esperaram uma gripe que matou 40 neste inverno,  para recomendar a lavagem frequente das mãos. Enquanto a gripe comum matava 70 mil a cada ano,  lavar as mãos não era preocupação. Que porcaria!

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