O procurador-geral de Justiça de Mato Grosso, José Antônio Borges Pereira propôs junto ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido liminar, contra a Lei Municipal nº 2939, de 15 de março de 2021, aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo prefeito de Sinop, Roberto Dorner (Republicanos). A legislação estabelece o funcionamento de igrejas e templos religiosos como atividade essencial e veda o fechamento desses espaços como medida de controle da pandemia da Covid-19. A referida lei admite a limitação da ocupação desses locais em situação de calamidade, mas veda seu fechamento integral.
Na ADI, cuja relatoria será do desembargador Rubens de Oliveira Santos Filho, o procurador-geral de Justiça argumenta que a lei “encontra-se eivada de inconstitucionalidade formal, por violar frontalmente a autonomia dos entes federados no pacto federativo, ao extrapolar a competência suplementar reconhecida aos Municípios no que diz respeito às medidas de restrição à liberdade, adotadas no enfrentamento da pandemia”
Entre os questionamentos feitos pelo Ministério Público Estadual na ação, está o “vício de iniciativa”, uma vez que o poder público municipal violou a Constituição Estadual ao extrapolar a competência suplementar do município em relação ao Estado e à União no gerenciamento de crise sanitária, como a vivida hoje pelo estado e pelo país.
De acordo com a Constituição Federal, União, Estados e Municípios possuem competência administrativa comum, enquanto União e Estados detêm competência legislativa concorrente. Já os municípios dispõem de competência legislativa suplementar.
Por outro lado, segundo o procurador, a Lei Federal nº 8.080/1990, que dispõe sobre as condições para promoção, proteção e recuperação da saúde, regulou em todo o território nacional as ações e serviços públicos nessa área, cabendo à União a definição e coordenação nacional do sistema de execução das ações, aos Estados coordenar e, de forma complementar executar ações e serviços de vigilância epidemiológica e sanitária, ficando os municípios incumbidos apenas de executar os referidos serviços, respeitando as diretrizes das coordenações nacional e estaduais.
Com o reconhecimento da situação de emergência internacional diante do surgimento e propagação da epidemia do Novo Coronavírus, a União editou uma lei estabelecendo as medidas que poderiam ser adotadas no âmbito das ações e serviços epidemiológicos. A referida norma serviu de lastro para que o Governo do Estado editasse o Decreto nº 420, de 23 de março de 2020, decretando situação de emergência em Mato Grosso. Posteriormente, várias outras medidas foram adotadas pelo governo estadual para o enfrentamento à pandemia, entre elas, o Decreto nº 462, de 22 de abril de 2020, tratando de medidas não farmacológicas de combate ao Novo Coronavírus excepcionais, de caráter temporário, restritivas à circulação de pessoas e ao funcionamento de atividades privadas.
Em março deste ano, com o aumento significativo do índice de ocupação de leitos de UTI nas unidades de saúde, o Estado editou o Decreto nº 836/2021, atualizando as medidas restritivas ao funcionamento do comércio de bens e serviços e instituindo o limite máximo de 50 pessoas, ou 30% de ocupação dos espaços em eventos sociais, corporativos, igrejas, templos, dentre outros. O decreto teve sua vigência prorrogada por outro editado posteriormente.
Na ADI proposta ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça, o Ministério Público Estadual cita várias decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal reconhecendo a autonomia dos Estados e Municípios para editar normas complementares às medidas já determinadas pelo Governo Federal, mas nunca contrariando ou minimizando o que foi estabelecido por atos da União.
“Nesta escala de análise, não se pode perder de vista que os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, vêm prestigiando as normas estaduais de controle sanitário e epidemiológico, a fim de que seja mantida uma coordenação dos atos necessários ao enfrentamento da situação de calamidade decorrente da pandemia do Novo Coronavírus, de tal sorte que as administrações municipais devem se manter alinhadas com a definição de serviços e atividades essenciais, bem como com as medidas de restrição à circulação social impostas pelo ente estadual, sob pena de desarticulação das ações de vigilância epidemiológica e sanitária”, afirma o procurador-geral José Antônio Borges Pereira, que aponta ainda risco de violação à ordem pública.
O procurador-geral destaca que é “de clareza solar que o município de Sinop, ao editar a Lei Municipal nº 2939, ignora completamente que o ente municipal extrapola sua competência para tanto, além de subestimar todos os esforços do Estado do Mato Grosso para o enfrentamento da pandemia até aqui, inclusive desnaturando o mapa de risco adotado para a gestão da crise, que prevê medidas qualificadas para os municípios, segundo cada nível de risco em que estiverem”.
Na Ação Direta de Inconstitucionalidade com pedido liminar, o procurador-geral requer que sejam solicitadas informações ao prefeito de Sinop sobre a liberação do funcionamento de igrejas e templos, e a notificação do procurador-geral do município para manifestação de defesa.