A pandemia do novo Coronavírus e o isolamento social provocado desde março ‘alteraram’ e até ‘revolucionaram’ diversos aspectos da sociedade, alguns, inclusive, de maneira definitiva. No Judiciário não foi diferente, e com isso o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, por meio Corregedoria-Geral da Justiça, disciplinou e regulamentou a utilização de videoconferência para realização de audiências e demais atos judiciais no âmbito do primeiro grau, através de provimento baixado em maio.
O juiz da 4ª vara criminal da comarca de Sinop, Mário Augusto Machado, significa um maior alinhamento com a tecnologia, como é o caso das audiências virtuais, proporcionando maior celeridade, além de economia ao erário. “É um procedimento já positivado, ou seja, regulamentado no Código de Processo Penal e também Civil, e que passou-se a ser utilizado com mais frequência em decorrência da pandemia. Entendo que é uma ferramenta fundamental dentro da realidade de evolução tecnológica que todos nós vivenciamos”, avaliou, ao Só Notícias.
“Isso não só por uma questão de eficiência, mas sobretudo de economia ao erário público, de deslocamento de pessoas e para a segurança pública também é fundamental, pois você evita transporte desnecessário, principalmente de pessoas que estão sob custódia do Estado. As vezes estão em outras cidades em unidades prisionais e precisam ir para audiências em comarca diferente, e isso evita gastos com escolta, ou seja deixa de tirar profissionais que precisam estar fazendo a segurança de um estabelecimento penal para conduzir um reeducando até o fórum. Com o meio virtual, essas questões são resolvidas”, acrescentou.
Com as audiências virtuais, todas as partes envolvidas no processo atuam de maneira ‘remota’. Os presos, por exemplo, participam de dentro das unidades penais, ainda assim com a possibilidade de entrevista com o advogado de defesa, por meio de uma linha direta em contato telefônico. Já as testemunhas, podem atuar de suas residências ou até mesmo locais de trabalho, sem alteração de rotina ou prejuízos, assim como juízes, e outras partes.
Na penitenciária Ferrugem, em Sinop, por exemplo, cerca de 200 atendimentos virtuais são realizados, semanalmente. “O projeto de videoconferência já era bem importante e sólido para nós ainda antes da pandemia. Dado ao grande número de ações, precisávamos investir em alternativas para a questão logística, de custo e também de aproveitamento operacional. Chegamos a fazer mais de 1,6 mil escoltas em um ano, isso dentro da própria cidade, então já era um investimento necessário”, explicou, ao Só Notícias, o diretor adjunto da penitenciária, Clemir Candelorio de Olandra.
Para estruturação da nova modalidade na unidade, que conta com aproximadamente 900 reeducandos, foram investidos cerca de R$ 80 mil entre equipamentos e reformas de quatro salas para a prática. “A 4ª vara, com o juiz Mário Machado, foi fundamental porque ele foi o primeiro magistrado a se propor fazer os testes. Tivemos parceria também com a defensoria e Conselho da Comunidade. Em 2020, com a pandemia, já estávamos com o projeto sólido e pudemos ver na prática o ganho de tempo, de custo, de facilidade operacional para funcionar”, pontuou.
Clemir ainda ressaltou que a prática oferece mais segurança em todos os aspectos. “Tem sido uma alternativa nesse momento que a movimentação deve ser reduzida e além de ser viável no ponto de vista da pandemia, ela tem um ganho muito grande até mesmo para a própria sociedade porque diminui o risco de movimentação de presos de alta periculosidade, as ações são feitas dentro da unidade, sem colocar em risco as equipes policiais, a movimentação de trânsito de viaturas e sem perigo de possibilidade de fugas, resgates, dentre outros. É uma ferramenta, independente da pandemia, de segurança e de logística”.
A tese de praticidade e facilidade das audiências on-line também foi defendida pelo comandante regional da Polícia Militar em Sinop, coronel Wesney de Castro Sodré. “Está sendo muito bom e proveitoso. Para ter ideia a maioria das nossas audiências é na 11ª vara da Justiça Militar, em Cuiabá, então muitas vezes os policiais tem que se deslocar das mais diversas regiões do Estado para participar na capital. Com a videoconferência isso altera, não precisa sair da sede do município que trabalha. Para o policial é excelente, seja ele testemunha, indiciado ou vítima, é bom para todos. Evita que peguem estradas, deslocamentos, perigos. Favorece muito mesmo”, detalhou, ao Só Notícias.
O juiz Mário Machado reforçou e reconheceu o empenho e trabalho de todos os ‘protagonistas’ que atuam nas videoconferências. “Tudo acontece graças a participação do Ministério Público, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil, Policias Militar, Civil e secretaria de Segurança Pública, através da Polícia Penal. Todos aderiram e estão cumprindo rigorosamente o que prevê a lei em prol do benefício da sociedade e estão colaborando bastante. É necessário haver esse reconhecimento e gratidão”.
Ainda no ponto de vista do magistrado, dada tamanha eficiência, a prática deve continuar fortalecida em período pós-pandemia. “Acredito que o judiciário vá continuar assim, e que vai ser regra, com a exceção sendo as audiências presenciais. Creio que o Congresso deve editar norma nesse sentido e os tribunais devem regulamentar. Acho que passado esse período os atos processuais, principalmente as audiências, em todas as esferas, devem ser assim. A economia e praticidade são indiscutíveis e sem dúvida alguma o administrador público tem que levar isso em consideração”, salientou.
“Vejo que é uma evolução que não tem como voltar. Aqui em Mato Grosso o Tribunal de Justiça já saiu na vanguarda, regulamentou isso, inclusive a comunicação de atos, fazemos pelo sistema on-line, com chamado malote digital, as comunicações chegam, são autenticadas, ou assinadas. A secretaria de Segurança e as unidades prisionais, estão extremamente evoluídas tecnicamente, com pessoas competentes, qualificadas, é um trabalho eficiente, respeitando a lei, os direitos do reeducando e agora colaborando muito com a justiça criminal nesse trabalho de apoio às audiências por vídeo”.
Agora, de acordo com Mário, é essencial que os gestores públicos busquem dar mais estrutura tecnológica. “É necessário que haja investimento em aparelhos, computadores, melhorar os sinais de internet, com maior capacidade de dados. Isso tudo o poder público tem que ter, são ferramentas básicas, e acredito que todos os gestores vão se empenhar na eficiência e melhorias. Não creio que vá haver regressão, paralisação ou suspensão dessa ferramenta, acho que é nadar contra a correnteza. O que temos que fazer é focar o investimento em eletrônica”, apontou.
A observação de maior estrutura técnica também foi feita pelo comandante da PM. “Nós disponibilizamos uma sala no Comando Regional para isso, separamos um espaço, fornecemos computador, webcam, só a internet que ainda não é muito qualificada, mas se preferir o policial pode estar utilizando seus aparelhos e sua rede de dados particular. Então no nosso caso a única dificuldade é a logística, ter equipamentos bons, e os dados de navegação. Ainda estamos meio que tentando melhorar esse aspecto, e é necessário fazer investimentos”, completou.