A família de um tratorista vítima de um acidente fatal na fazenda em que trabalhava, em Novo Mundo, próximo a Guarantã do Norte Grosso, garantiu o direito de receber indenização por dano moral em decisão unânime da 1ª turma do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso. Os desembargadores ainda condenaram o fazendeiro a pagar pensão mensal à viúva, no valor de dois terços da remuneração integral do operador de máquina pesada que havia sido contratado em março de 2018 e morreu 13 dias depois, após ser atropelado por um trator dirigido por outro empregado. Ele chegou a ser socorrido e levado até Guarantã. Considerando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, além de critérios como a capacidade financeira do empregador, a Turma fixou o pagamento da compensação pelo dano moral em R$ 100 mil, divididos entre a viúva e os quatro filhos.
A falta de perícia policial aliada ao fato de que no momento do acidente só haviam duas pessoas (a vítima e o condutor do trator que se tornou, portanto, a única testemunha do ocorrido) demandou uma análise detalhada do caso. Inicialmente, a sentença proferida na 2ª Vara do Trabalho de Sinop concluiu que, diante da falta de evidências que a morte do trabalhador aconteceu de modo diverso da versão contada pelo colega tratorista, a culpa foi exclusiva do operador.
Os familiares recorreram ao TRT argumentando que a testemunha não era isenta por estar diretamente envolvida na tragédia, questionaram o relato de que a vítima estaria de folga porque seu trator estava quebrado, já que o fazendeiro contratou outro tratorista como diarista para realizar os mesmos serviços habitualmente executados pelo falecido.
A família também ressaltou que a viúva ficou completamente desamparada porque não pôde contar nem mesmo com o benefício previdenciário do INSS, uma vez que a Carteira de Trabalho do operador não havia sido assinada. Por fim, apontou que a atividade desenvolvida era de risco elevado (grau 3) e mesmo assim sequer foram fornecidos treinamentos e equipamentos de proteção individual.
Os magistrados da 1ª turma do tribunal deram razão à família. Acompanhando o relator, desembargador Paulo Barrionuevo, concluíram não ser verdadeira a tese de que o operador de máquinas não estava prestando serviços à fazenda naquela data. Isso porque, mesmo considerando a possível quebra do trator utilizado por ele, o empregado continuou à disposição do empregador, tanto que acompanhava o outro tratorista, sendo que ambos “fizeram o serviço” no dia do acidente, como confessado no processo pelo próprio proprietário da fazenda.
Conforme ressaltou o relator, “não é minimamente crível que o empregado tenha permanecido do dia 13 (data em que comunicou o réu da quebra do equipamento) até o dia 19 (data do acidente) sem realizar qualquer atividade na fazenda.” A turma avaliou também que o fazendeiro foi negligente em vários aspectos. A primeira falha foi a de contratar condutor de máquina agrícola pesada sem realizar treinamento e nem mesmo questionar a existência de capacitação anterior. Da mesma forma, não foram fornecidos os EPIs e faltou fiscalização do cumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho. Esse último ponto ficou evidente na ausência do empregador ou qualquer outro preposto no dia do acidente, tanto que o colega tratorista teve que percorrer cerca de 7 km a pé para procurar ajuda na fazenda vizinha.
A justiça também entendeu que houve falha ao se permitir que a máquina agrícola fosse utilizada como meio de transporte: o atropelamento ocorreu quando o trabalhador, que estava sendo levado na lâmina do trator, escorregou e caiu na frente do veículo. Nesse trecho, a própria testemunha afirmou que o deslocamento foi para arrumar uma grade e não para chegar até o local de pesca. “Não é a hipótese de se cogitar de culpa concorrente ou exclusiva do trabalhador, até porque a responsabilidade pela segurança do passageiro é do condutor que deveria se negar a carregar uma pessoa em uma máquina que não comportava passageiros, ou até mesmo a movimentar o trator enquanto o de cujus permanecesse na posição em que estava”, explicou o relator.
Também, como lembrou o magistrado, a imprevidência do condutor do trator não afasta a responsabilidade do empregador porque, conforme a legislação, esse responde pelos atos praticados por seus empregados no exercício do trabalho. Assim, a turma concluiu que o empregador é culpado por não ter tomado as precauções para evitar o acidente e deve arcar com o pagamento de pensão mensal à viúva. O valor, no entanto, não será o da remuneração integral do tratorista, como pedia a família, e sim equivalente a dois terços dela. O percentual segue jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Ainda com relação à pensão, o relator lembrou que ela é devida de forma vitalícia, mas em razão da limitação do pedido feito pela própria família, foi deferido o montante com base na expectativa média de vida da vítima, calculada pelo IBGE em 76 anos de idade.