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A (des)graça das Eleições

Emanuel Filartiga – Promotor de Justiça em Mato Grosso
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Sempre pensei na democracia como uma vontade gulosa pela humanidade. Um cálido sentimento pela fraternidade humana. Como bem disse Pinto Ferreira, uma simpatia pelos pequenos, pelos humildes, pelos sofridos. Instituição que embala a possibilidade de que a razão esteja com o “adversário”.

Nunca me coloquei na política, no que se chama política no Brasil. Li que a política tem por fim tornar a vida mais cômoda e as pessoas mais felizes. Desde menino vejo a “política” fazendo precisamente o contrário…vale dizer, vida incômoda e pessoas infelizes.É só andar pelas ruas e pelascalçadas de qualquer cidade, principalmente nas periferias destes locaise ver…

Quando adolescente, num “bolicho”, lugar muito comum também nas periferias das cidades, ouvi de dois senhores uma reflexão sobre as eleições. Dizia um deles, em outras palavras: “Quem conhece os personagens que andam metidos nessa política sabe que nada de sério os move, nem qualquer ideal alimenta a campanha deles. O que eles querem são os proventos, cargos e, sobretudo, as vantagens que trazem. Não querem o bem público, seu escopo é arranjarem-se junto de suas famílias, quando são ligados a elas.”

Com a atuação nas promotorias eleitorais, em vários municípios, vi casos que trazem provas de que “os senhores do bolicho” não estavam muito errados. Narro só dois deles.

No primeiro, um candidato chegava na promotoria e denunciava que seu adversário estava oferecendo cestas básicas em troca de voto. Afirmava que tinha provas: era só ir na casa do candidato da oposição que lá encontraria as cestas básicas, especificamente no quintal da casa. Ele não contava com a câmera que havia num estabelecimento próximo à casa, onde as imagens mostravam o próprio denunciante lançando as cestas básicas no quintal do adversário durante a madrugada.

No segundo, durante o período eleitoral, um candidato trafegava pela cidade com um carro e em alguns pontos estacionava o veículo e conversava com pessoas determinadas, durante a conversa abria uma mala preta e entregava alguns objetos. Foi aberta investigação e se concluiu que na mala havia somente papéis em branco e, perguntado ao candidato o motivo daquela conduta, este afirmou que simulava compra de votos para causar “febre” à oposição.

Isso é só durante as campanhas. Se forem eleitos, no decorrer dos mandatos, é ainda mais espantoso e triste.

Lima Barreto dizia que toda pessoa nasceu mais ou menos para ser um tiranozinho em qualquer coisa, trata logo de pôr pessoalmente em ação a autoridade de que é investido.

Então quando é prefeito, vereador, um brasileiro qualquer, de um lugarejo por aí, se veste de delírios cesarianos. Ocorre que – é preciso dizer o óbvio – na verdade eles não são César e nós não somos o Império Romano.

Ora, eleitor(a) amigo(a), não tem nunca a marca da grandeza os desvarios do poder. Com efeito, são chatos, medíocres e egoístas, tudo contra o espírito da Democracia.

Fazemos eleições o tempo todo na vida… escolhemos a cada passo. Escolhamos mergulhados em espírito democrático. Com a lembrança de que os políticos corruptos e cesarianos não são de outra espécie, outra galáxia, formados por estranhas células; nós os conhecemos, são daqui, das nossas ruas, casas, escolas, bairros… e do espelho.

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