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O reestabelecimento da Ordem Jurídica

James Rachid Jaudy
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Nos últimos dias várias reportagens trazem matérias que de alguma forma falam sobre a Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos Delegados, a AGER, e dos serviços públicos por ela regulados e fiscalizados. Infelizmente, algumas pessoas ainda não conhecem a importância – e tão pouco – a seriedade dos serviços desenvolvidos por esta Agência.

Apenas para pontuar, a AGER é uma pessoa jurídica de direito público interno, constituída sob a forma de autarquia, que em razão de algumas características diferenciadas, restou denominada na lei que estabelece sua organização, estrutura e competência, de autarquia em regime especial. Dentre algumas diferenças entre a autarquia comum, conceituada desde o Decreto-Lei 200/67 e a autarquia em regime especial, estão: 1. os diretores terão mandatos, com prazos estabelecidos por sua lei de criação; 2. deverão, previamente à nomeação pelo governador do estado, ser sabatinados e aprovados pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso; 3. não poderão ser exonerados antes de findar o mandato, com exceção das possibilidades descritas em lei; 4. ao fim do mandato, cumprirão a denominada quarentena, período no qual não poderão trabalhar em empresas reguladas e fiscalizadas pela Agência.

Pois bem, feitos os esclarecimentos acima, destacamos ainda que a AGER é a Agência Reguladora que normatiza, regula e fiscaliza os serviços públicos delegados à iniciativa privada pelo Estado de Mato Grosso. A importância das competências legalmente atribuídas à AGER não ressoaram em ações de fortalecimento da Agência pelos últimos governos, sendo que em seus quadros existe um corpo técnico altamente especializado, fruto exclusivo da incansável busca pessoal de cada servidor por conhecimento e zelo na sua área de atuação. Os servidores da área técnica da AGER são o que pode realmente ser chamados de Especialistas em Regulação, forjados na dura rotina de estudos e prática impostos pelas necessidades do cargo. Os salários desses destacados especialistas estão defasados em mais de 60% em relação às carreiras criadas no mesmo período e com equivalente grau de complexidade em sua atuação.

O sonho de uma sede própria ainda é apenas um sonho banhado por desilusões continuas das últimas gestões. Enfim, o amor pela Agência e a consciência da responsabilidade para com o estado de Mato Grosso e seus cidadãos, é o que alimenta a determinação dos Analistas Reguladores da AGER. Soma-se a tudo isso, o pesado fardo de estarem vivendo, nos últimos meses, tempos especialmente desafiadores.

Nesse caldo de instituições resplandece o bastião de lutas em prol da categoria e da própria Agência: ASAGER – Associação dos Servidores Efetivos da AGER, sempre pronta a buscar por legalidade, autonomia e moralidade da coisa pública, além de defender os interesses de seus associados.

Com a justificativa de atender um Termo de Ajustamento de Conduta firmado com o Ministério Público Estadual, foi publicado em 21 de dezembro de 2018, pelo então Chefe do Poder Executivo, o Decreto nº 1.751, que definiu nova estrutura organizacional para a AGER. O citado decreto não teria maiores novidades caso em seu bojo não houvesse sido inserida algumas competências atribuídas ao Presidente Regulador, contrariando até mesmo a própria lei de estrutura da Agência, sem contar alguns outros princípios legais e constitucionais.

Não necessitou de qualquer atenção a determinação de que tal decreto assegurava a autonomia administrativa, financeira e estrutura própria à AGER, uma vez que se tratam de características próprias da definição de autarquias, e já asseguradas na Lei Complementar nº 429/2011, que dispõe sobre a organização, estrutura e competências da AGER. Todavia, o referido ato normativo retirou da estrutura da Agência a Diretoria Ouvidora, assim como, a Coordenadoria de Ouvidoria, elo primordial de ligação entre os usuários – leia-se: sociedade – e as empresas prestadoras dos serviços delegados. Inovação em total desencontro com a acima citada lei complementar, posto que ela define que a Ouvidoria da AGER será dirigida por um Diretor Ouvidor.

Ao ler o Primeiro Termo Aditivo ao Termo de Ajustamento de Conduta firmado pelos mesmos entes que o pactuaram inicialmente, não foi possível localizar em qualquer parte das linhas ou entrelinhas do documento, alguma cláusula com a determinação ou compromisso que resultaria na necessidade de retirar a Diretoria e Coordenadoria de Ouvidoria da estrutura da AGER. A bem da verdade é que jamais acreditei que o Ministério Público Estadual, entidade secular e constitucionalmente garantida em todas as Cartas Magnas do nosso País, defensor intransigente da legalidade, houvesse admitido na redação do aditivo do citado TAC, a retirada do sistema de ouvidoria da estrutura da AGER.

O principal instrumento de comunicação do Estado e da Agência Reguladora com os usuários dos serviços públicos é justamente a unidade de Ouvidoria da Agência. Para não parar aí, o já malfadado decreto ainda trouxe em seu bojo a delegação ao Diretor Presidente da AGER, da prática de atos de provimento de cargos em comissão e função de confiança na Agência Reguladora, sendo que este artigo obedeceu à cláusula do Termo Aditivo ao TAC. Por certo, os ilustres operadores do direito que firmaram tal documento têm pleno conhecimento que o ato de nomear e exonerar na Administração Pública Direta e Indireta cabe, exclusivamente, ao Chefe do Poder Executivo Estadual. Mais que uma faculdade, é um poder inerente ao exercício do cargo ocupado por aquele que obteve a confiança da maioria dos eleitores para administrar o Estado, aplicando o plano de governo apresentado à população durante a campanha eleitoral.

Todavia é permitido constitucional e legalmente que o Chefe do Executivo Estadual delegue esse poder ao Secretário de Estado ou ao Presidente da Autarquia, estando implícito que isso sim é uma faculdade, e, como tal, não pode um governante ser obrigado a continuar permitindo aquilo que o outro permitiu, uma vez que a faculdade de delegar é de cada governante, de forma personalíssima. Logo, a delegação da competência de nomear e exonerar conferida por um governo não tem qualquer continuidade quando começa uma nova administração legalmente constituída pelo poder das urnas.

Nessa desordem do entendimento das normas, não há qualquer dúvida de que a cláusula do primeiro aditivo do TAC firmado, que determinou a edição de instrumento normativo delegando os poderes de nomear e exonerar na AGER deveria ser complementada com a informação de que a referida obrigação estaria restrita ao Governador que assina o documento, pois foi aquele que acordou em delegar sua competência para a prática dos citados atos. Visando corrigir tão explicitas ilegalidades, e algumas outras, a Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso, por meio das lideranças partidárias, aprovou o Decreto Legislativo nº 56, de 26 de abril de 2019, suspendendo os efeitos do Decreto nº 1.751, de 21 de dezembro de 2018, deixando claro em sua justificativa todos os pontos em desacordo com a norma legal e constitucional trazidos pelo decreto de 2018. Não consigo visualizar qualquer prejuízo ao Estado de Mato Grosso ou à AGER, a suspensão dos efeitos do referido decreto. Aliás, pelo contrário, o exercício dos poderes, explícitos ou implícitos, conferidos ao Diretor Presidente Regulador da AGER, pelo, agora suspenso, decreto emitido no final do governo passado, resultou em uma perturbação das atribuições da Diretoria Colegiada, órgão máximo de direção da AGER.

As atribuições recebidas por delegação do governo passado foram usadas como reais atribuições e competências de Poder, quase que igualando a AGER, ao quarto, talvez quinto ou sexto Poder do Estado Federado, gozando não só de autonomia, mas também de independência administrativa. Por tais razões, os Analistas Reguladores concursados efetivos da AGER, instrumentos do Estado para garantir a qualidade na prestação dos serviços públicos delegados, exaltam a atuação da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso, que no uso de sua competência, restabeleceu a Ordem Jurídica com a aprovação do Decreto Legislativo nº 56.

Nesse sentido, o capacitado corpo técnico da AGER, relegado a segundo plano pelo atual Diretor Presidente, quando não subutilizado na realização de tarefas que poderiam ser desenvolvidas por servidores menos especializados, espera que o atual Governador do Estado de Mato Grosso adote na AGER, seguindo os passos da Assembleia Legislativa, medidas de restauração da Ordem Jurídica e Administrativa através de um novo Decreto Executivo em total sintonia com a expectativa da categoria dos Analistas Reguladores que busca participar das ações finalísticas às quais lhe são incumbidas por lei trazendo, com isso, seu necessário resgate da autoestima e dignidade.

 

James Rachid Jaudy é presidente da Associação dos Servidores Efetivos da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Delegados (Asager) em Mato Grosso

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