Por unanimidade, o pleno do Tribunal de Contas de Mato Grosso homologou nesta quarta-feira (19/12) medida cautelar que determinou a suspensão imediata dos procedimentos de transferência da gestão do novo hospital e pronto-socorro da capital, cuja inauguração está prevista para o dia 28, à Empresa Cuiabana de Saúde Pública. A cautelar foi concedida pela conselheira interina do TCE-MT, Jaqueline Jacobsen, em Representação de Natureza Interna proposta pela Secex de Saúde e Meio Ambiente.
Em caso de descumprimento da decisão plenária, será aplicada multa diária de 10 UPFs, cerca de R$ 1,4 mil, aos responsáveis, respectivamente o prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro, o atual secretário municipal de Saúde, Luiz Antônio Pôssas de Carvalho, e o diretor-geral da Empresa Cuiabana de Saúde Pública, Alexandre Beloto Magalhães Andrade.
A decisão da conselheira, publicada no Diário Oficial de Contas na última sexta-feira, foi baseada em indícios de que a transferência da gestão do novo hospital à Empresa Cuiabana de Saúde Pública desencadeará “uma gestão antieconômica e fraudulenta capaz de originar danos irreparáveis ao erário, inclusive, com graves prejuízos à qualidade dos serviços prestados pelo SUS à população cuiabana”.
Formaram o convencimento da conselheira o relatório da equipe técnica do TCE-MT e as investigações realizadas na Empresa Cuiabana de Saúde Pública pela Delegacia Especializada em Crimes Fazendários (Defaz-MT), em conjunto com Ministério Público Estadual e Ministério Público Federal.
Ao votar pela homologação da cautelar, a conselheira Jaqueline Jacobsen esclareceu que a cautelar impede apenas a transferência da gestão do novo pronto-socorro para a Empresa Cuiabana de Saúde, em face das irregularidades apontadas pela equipe técnica do TCE-MT. Ela reforçou que a decisão não oferece qualquer obstáculo à inauguração do centro médico hospitalar, desde que a prefeitura, por meio da secretaria municipal de Saúde, assuma os serviços ou instaure o regular procedimento licitatório para contratar a empresa responsável pela gestão.
A probabilidade de lesão aos cofres públicos ocorre em função da atuação promovida pelo então secretário municipal de Saúde, Huark Douglas Correia, que estaria agindo por interesses privados nas atividades da Empresa Cuiabana de Saúde Pública, em função das contratações e repasses de valores em benefício de empresas privadas gerenciadas por ele. De acordo com o Ministério Público Federal, o ex-secretário municipal de Saúde seria um dos proprietários de fato da empresa e sócio participante oculto. Huark teria inclusive representado a empesa na inauguração das novas alas de UTI do Hospital São Lucas, em Lucas do Rio Verde, no dia 25 de outubro de 2017.
“Especificamente sobre essa constatação acerca da representatividade da empresa, a equipe técnica chamou a atenção para a informação pertinente à existência de uma procuração pública datada em 16 de março de 2015, com validade de 5 anos, outorgada por outro sócio da empresa, conferindo poderes típicos de sócio a Huark Douglas Correia, em especial, para administrar as contas bancárias indicadas para recebimento da remuneração pelos serviços prestados na execução dos contratos firmados com a Empresa Cuiabana de Saúde Pública, revela trecho da decisão cautelar da conselheira.
Nomeado entre os anos de 2015 e 2017 para o cargo de diretor técnico da Empresa Cuiabana de Saúde e, de modo consecutivo para o cargo de diretor geral da empresa, Huark Douglas Correia coordenou certames que culminaram na contratação da empresa. Na sequência, em 14 de março deste ano, ele foi nomeado para exercer o cargo em comissão de Direção e Assessoramento Superior de secretário na Saúde e presidente do Conselho Municipal de Saúde. Nesse período, de 2016 a 2018, a Empresa Cuiabana de Saúde Pública repassou para a Proclin o equivalente a R$ 12,8 milhões. À Qualycare foi repassado R$ 1,8 milhões. Somente no dia 17 de novembro do ano passado, ele autorizou transferências bancárias pela Empresa Cuiabana de Saúde Pública, na ordem de R$ 223 mil e R$ 404,5 mil em benefício da Proclin.
Para conceder a cautelar, a conselheira enumera diversas razões, como ausência de respaldo do Plano de Trabalho Operativo, da definição dos critérios de avaliação e desempenho desse gerenciamento, dos estudos técnicos e jurídicos pertinentes à demonstração da economicidade e eficiência do modelo projetado para implantação da análise do impacto orçamentário-financeiro e das pesquisas para prognosticar o emprego da força de trabalho no local, em inobservância ao ordenamento jurídico vigente. Cita também que irregularidades relacionadas à Empresa Cuiabana de Saúde Pública, gestora do Hospital São Benedito, resultaram na deflagração da “Operação Sangria” pela Polícia Civil e que o ex-secretário Huark Douglas Correia pertence ao rol dos alvos da referida operação. O ex-secretário foi preso pela Polícia Civil, ontem.
Destaca ainda a verificação da baixa eficiência da Empresa Cuiabana de Saúde Pública na gestão do Hospital São Benedito, citando, como exemplo, a aquisição de equipamentos para a sala de hemodinâmica, em dezembro de 2016, ao custo de R$ 1,7 milhão, e apesar disso o serviço permanece inoperante até hoje, em prejuízo aos pacientes que aguardam pelos procedimentos.
A conselheira Jaqueline Jacobsen chamou atenção para outro fato que, na avaliação dela, assegura a falta de razoabilidade na transferência da gestão do pronto-socorro à empresa. Trata-se da possibilidade iminente da lei municipal que autorizou a criação da empresa pública, ser declarada inconstitucional, por meio do julgamento ajuizado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), “o que, naturalmente, acarretará em sérios prejuízos a administração do município para manter, com inequívoca urgência, o gerenciamento do hospital, sem afetar os atendimentos à população local”, disse a conselheira.
A inclusão do gerenciamento do novo pronto socorro à empresa, responsável pela gestão do Hospital São Benedito, foi aprovada pelo Conselho Municipal de Saúde no dia 30 de novembro, apesar das 20 ressalvas feitas pela Comissão de Controle e Avaliação do Conselho Municipal de Saúde.
Por fim, a conselheira determinou ainda a remessa da cópia dos autos ao Ministério Público Federal, ao promotor de justiça Célio Joubert Fúrio, da 35ª Promotoria de Justiça do Núcleo de Defesa do Patrimônio Público de Cuiabá (Ministério Público Estadual) e ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), para conhecimentos e adoção das providências que entenderem necessárias.