Mato Grosso tem apenas 50 estabelecimentos agropecuários que produzem uva comercialmente para mesa ou processamento, segundo o Censo Agropecuário de 2017. Entretanto, as condições climáticas, associada à cultura sulista dos colonizadores de boa parte do estado fazem com que a viticultura tenha grande potencial. A falta de assistência técnica capacitada, no entanto, tem sido um entrave à produção.
Um exemplo são os agricultores Nélson e Cecília Maziero. Em 2005 eles começaram a produzir uva em Sinop. Sem assistência, adotaram as práticas de manejo que aprenderam no Sul do país. Porém, logo perceberam que não teriam os mesmos resultados. Buscaram informações com outro produtor em Nova Mutum (250 km de Sinop) e, a partir das orientações que receberam, conseguiram melhorar a produção.
Hoje vendem toda a colheita de uvas Niágara e Isabel Precoce e o vinho feito com uvas Bordô na porta da chácara, com preços até 50% mais baixos do que o cobrado nos supermercados locais e, ainda assim, recebendo mais do que o dobro do valor de comercialização em regiões produtoras do país.
Embora o negócio vá bem, a falta de assistência técnica tem limitado a produção a oito toneladas na área de um hectare onde cultivam 2.500 videiras. Número que sr. Nelson espera ver dobrado na próxima safra apenas com a mudança na forma de fazer a poda de produção. A instrução para isso ele recebeu durante uma visita de pesquisadores e técnicos que foram à sua propriedade como parte das atividades da Capacitação em Vitivinicultura que a Embrapa promoveu em Sinop e terminou ontem.
O curso é parte da capacitação continuada de técnicos em fruticultura e visa instruir profissionais de assistência técnica e extensão rural para que possam assistir aos produtores rurais dos municípios onde atuam. Este módulo sobre o cultivo e processamento de uvas era uma demanda antiga, desde 2012, quando a Embrapa Uva e Vinho lançou em Sinop, na Embrapa Agrossilvipastoril, a cultivar BRS Magna, validada em Mato Grosso.
Embora a produção de uvas em Mato Grosso ainda seja pequena, já há tecnologia disponível para o cultivo em regiões tropicais e que se adequam ao clima do estado. Diferentemente da região Sul, onde as plantas entram em dormência no inverno, com o calor constante, elas vegetam o ano todo. Com isso, é preciso fazer duas podas, uma de formação de galhos e outra de produção, obtendo duas safras no ano.
O pesquisador da Embrapa Uva e Vinho Reginaldo Teodoro de Souza destaca que as condições climáticas de Mato Grosso são semelhantes às da região de Jales (SP), onde a Embrapa tem um campo experimental para desenvolvimento e validação de tecnologias para a uva.
“É uma questão de condução da videira em região tropical. Todas as técnicas já estão estabelecidas. Época de poda, como controlar e como manejar a uva. Já temos até cultivares para a região. Mas deve-se tomar os devidos cuidados com relação às grandes áreas de soja plantadas e uma possível deriva de herbicidas. Um quebra vento com cercas vivas pode resolver o problema”, alerta.
Entre as cultivares recomendadas para a região estão BRS Ísis, BRS Núbia e BRS Vitória, para mesa, e BRS Magna e BRS Isabel Precoce para processamento.
De acordo com o analista da Embrapa Uva e Vinho João Carlos Taffarel, o período chuvoso é uma dificuldade para a cultura no estado, uma vez que a videira é originária de regiões mais secas. Dessa forma, o ideal é passar esse período sem produção. Porém ele garante que com o manejo adequado é possível contornar a adversidade.
“Temos de ter cuidado com melhoria da fertilidade do solo. Usar porta-enxertos adaptado a essa condição. São necessários tratamentos fitossanitários para controlar as principais doenças que causam perdas na produtividade e também morte de planta, que é o caso do míldio da videira. Cuidando desses quesitos básicos e desses detalhes do manejo, certamente se consegue ter sucesso na produção”, afirma Taffarel.
De acordo com o IBGE, 35 dos 141 municípios do Estado possuem produção comercial de uva, em diferentes regiões embora a produção seja pequena e esteja longe de atender a demanda do mercado local por uvas de mesa e para produção de suco.
A coordenadora do curso e analista da Embrapa Agrossilvipastoril, Suzinei Oliveira, vê no interesse crescente pela cultura um grande potencial, sobretudo para pequenos agricultores familiares. Por isso, a necessidade de capacitar os profissionais de assistência técnica que darão suporte aos agricultores.
Neste curso foram abordadas desde questões de manejo de solo, escolha de cultivares e porta-enxertos, até o processamento para sucos e vinhos. Passando também pela condução das videiras e técnicas de poda. Houve ainda oportunidade para degustação das variedades de uva e de sucos.
Para quem pensa em começar a produzir uva em Mato Grosso, o pesquisador Reginaldo Teodoro de Souza aconselha a cautela. Montar as estruturas de vagar, uma vez que o investimento é alto, e, principalmente, comprar mudas de boa qualidade. “O ideal é comprar em viveiros credenciados pela Embrapa em Minas Gerais ou no Rio Grande do Sul. Eles pegam material básico da Embrapa e produzem material livre de vírus, com boa sanidade e vendem com raiz nua. Mas é preciso se programar e um ano antes, encomendar os materiais especificando qual cultivar você quer. É perfeitamente viável enviar para cá”, aconselha. Com base em sua experiência empírica, Nelson Maziero também deixa seu recado para os interessados na cultura.
“A uva é só para quem gosta e tem amor e se dedica a isso. Não é para qualquer um, porque isso dá um trabalho monstruoso. Um trabalho muito grande. É para quem gosta mesmo. Mas vale muito a pena!”
A informação é da assessoria da Embrapa Agrossilvipastoril em Sinop.