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Fazenda é condenada em R$ 6 milhões por trabalho análogo a escravo no Nortão

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Redação Só Notícias (foto: Só Notícias/Diego Oliveira/arquivo)

A Justiça do Trabalho condenou uma fazenda localizada no município de Nova Santa Helena (123 km de Sinop), a pagar R$ 6 milhões por dano moral coletivo por submeter dezenas de trabalhadores a condições análogas a de escravo, segundo a assessoria do TRT.

A condenação inclui, além da propriedade rural onde 23 pessoas foram resgatadas pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel do Ministério do Trabalho em julho de 2017, outras duas empresas e sete integrantes da mesma família.

Ainda segundo o TRT, este foi o quinto resgate de trabalhadores em propriedades do mesmo grupo familiar. Os anteriores ocorreram em propriedades situadas no município de Nova Bandeirantes. As cinco fiscalizações resultaram em 324 trabalhadores resgatados, conforme dados do Ministério de Trabalho e Emprego.

Com uma extensão de 50 mil hectares, a fazenda tem entre suas atividades a criação de gado e lavoura e, conforme provas juntadas ao processo judicial, submeteu mais de 20 pessoas a condições degradantes, dentre elas um adolescente, de 17 anos, uma trabalhadora grávida de 8 meses e uma criança de 1 ano e meio. Todos expostos a riscos de contaminação pela falta d’água potável e de banheiro, uso de agrotóxicos e destinação inadequadas de suas embalagens e de todo o lixo produzido no local, que era descartado nas proximidades do alojamento, cuja condição foi comprovada como subumana.

O caso chegou à Vara do Trabalho de Colíder no mesmo mês em que se deu o resgate dos trabalhadores, por meio de uma ação civil pública ajuizada pela Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete), do Ministério Público do Trabalho (MPT).

Ao proferir a sentença esta semana, o juiz Mauro Vaz Curvo relacionou pelo menos 30 situações degradantes comprovadas, dentre elas a constante falta de água no alojamento, que ficavam dias a seco, e o fato de que os próprios trabalhadores compravam seus instrumentos de trabalho, como bota e chapéu. Além disso, pontuou também que o único banheiro não funcionava; as bombas para aplicação de venenos e embalagens ficavam espalhadas pelo quintal; o uso de roupa cotidiana na aplicação de agrotóxicos, as quais eram lavadas junto com as demais; o combustível para ligar o grupo gerador de energia era custeado pelos próprios trabalhadores, 12 pessoas dormiam em um pequeno quarto e em camas improvisadas e a comida era armazenada sem refrigeração.

“A situação desumana a qual foram submetidos os trabalhadores resgatados se torna ainda mais grave, pois os proprietários da fazenda tinham pleno conhecimento dos fatos, tanto é que o gerente da fazenda disse em seu depoimento que ‘já havia visto a condição em que os trabalhadores viviam e estava incomodado com a situação’ e que o proprietário ‘já estava ciente da situação'”, destacou.

O magistrado ressaltou ainda a intermediação fraudulenta da mão de obra de trabalho, por meio de gatos ou falsos empreiteiros, além do descumprimento das condições básicas da legislação trabalhista, incluindo as normas de saúde e segurança. “O tratamento concedido pela fazenda aos trabalhadores importa em total negação das condições mínimas de trabalho e equipara-os à coisa ou bem”, enfatizou.

Por tudo isso, concluiu que tipifica o crime de trabalho análogo a de escravo. Também reconheceu o dano causado, não somente aos resgatados, mas à sociedade de forma geral pela afronta a princípios fundamentais consagrados pela Constituição Federal como a dignidade da pessoa humana e valor social do trabalho, princípio da igualdade, princípio da valorização do trabalho humano e função social da propriedade.

Como compensação pelos danos morais coletivos, fixou o montante de R$ 6 milhões. Para chegar ao valor utilizou critérios como o dolo por parte do proprietário que, mesmo sabendo da situação subumana dos trabalhadores, os mantinham em situação degradante, a reincidência na prática de trabalhos em condição análoga à de escravo, a capacidade financeira dos réus, bem como o caráter pedagógico, compensatório e punitivo da medida.

Além da condenação pelo dano coletivo, a sentença confirmou a obrigatoriedade da empresa cumprir uma lista de 58 itens, determinada em caráter liminar pelo Tribunal Pleno do TRT de Mato Grosso, em 31 de maio deste ano.

Na lista consta a obrigação de se fazer a anotação na carteira de trabalho até 48 horas do início da prestação do serviço, pagar os salários até o 5º dia útil e o 13º até 20 de dezembro, depositar mensalmente o FGTS, fazer o registro dos empregados e de suas jornadas de trabalho, bem como conceder repouso semanal de 24h. Foi determinada a realização de exame médico admissional e periódicos anualmente e o fornecimento gratuito dos equipamentos de proteção individual (EPIs).

Na frente de trabalho, a fazenda deverá disponibilizar instalações sanitárias adequadas para atender a seus trabalhadores, abrigos que os protejam das intempéries durante as refeições e fornecer água potável e fresca e local ou recipiente para a conservação de refeições em condições higiênicas. Também terá de manter local para refeição com mesas com tampos laváveis, local adequado para preparo de alimentos, alojamentos separados por sexo, camas, além de instalação sanitária adequadas com água limpa, recipientes e demais itens básicos, a exemplos de vasos e chuveiros.

Com relação aos agrotóxicos, foi determinado que seja proibida a reutilização de embalagens vazias, dando destinação final prevista na legislação. Da mesma forma, que seja proibido o uso de roupas pessoais para sua aplicação, cabendo à empresa fornecer os EPIs ou vestimentas adequadas e água, sabão ou toalhas para higiene pessoal após a sua aplicação.

Na época, os desembargadores do Pleno deram prazo de 30 dias para que as obrigações fossem colocadas em prática, estabelecendo, em caso de descumprimento, multa diária de R$ 100 a cada obrigação descumprida e empregado prejudicado.

Na sentença desta semana, o juiz determinou a realização imediata de perícia na fazenda para se comprovar o cumprimento dessas obrigações, tendo em vista o fim do prazo dado pelos desembargadores. Em caso de descumprimento, o magistrado esclareceu que será cobrada multa prevista. Após essa data, o valor da multa diária passará a ser de R$10 mil por item descumprido em relação a cada trabalhador encontrado em situação irregular.

Por fim, o juiz determinou a intimação da União, a quem cabe a desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, de imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, para que essa tome as providências que prevê que as “propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular (…)”.

Também ordenou o envio do processo ao Ministério Público Federal, Polícia Federal, Receita Federal e Caixa Econômica Federal, para que tomem as providências previstas ante a comprovação do ocorrido na propriedade rural.

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