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De alma

Eduardo Gomes de Andrade
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Sobre apego material Jesus nos disse em Mateus que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no Reino de Deus. Essa frase dita há dois mil anos continua atual para exemplificar o que se prevê no tocante ao pleito que se avizinha. Bem antes da deflagração do processo eleitoral, o que mais se ouvia sobre política era desencanto. Na voz rouca das ruas havia uma mistura de frustração com vontade de renovação, não necessariamente de rejuvenescimento. O descontentamento cada vez ganhava maior consistência. O cidadão afastado do poder e de suas benesses, de saco cheio, dava sinais que teríamos uma verdadeira ruptura nos destinos do Brasil e de Mato Grosso. Dava, mas bastou à campanha ganhar as praças pra que o discurso popular mudasse.

Gosto muito de cachorro, mas não confiaria em nenhum Fila estranho a ponto de botar a mão em sua boca. A mesma cautela tenho com institutos de pesquisas, o que me faz desconfiar dos números por eles apresentados – mais na frente é fácil insistir que a pesquisa estava certa, mas que refletia apenas o pensamento de momento. Mesmo desconfiando não tenho alternativa senão me deixar pautar pelo que divulgam. Portanto, palatável ou não, as planilhas dos pesquisadores nos mostram que numa adaptação bíblica de rico para eleitor, aqui na Terra de Rondon, é mais fácil passar o camelo pelo buraco da agulha…
Claro que uma considerável parcela da população não mudou seu modo de ver a política, suja e viciada, que escreve um ciclo nacional que muito envergonhará nossos filhos e netos lá na curva do amanhã. Porém, o clamor que inflava o peito no ontem, não mais existe.

Um interesse aqui, outro ali, um cargo pro cunhado zureta, uma nomeação para filha destrambelhada, um bico ‘na quilo’, as migalhas da sobra do poder, o sorriso faceiro do político que está com a faca e o queijo na mão pra se eleger – e pronto. Reeleições e eleições estão garantidas.

Ninguém precisa nutrir esperança de mudança plena – quando muito timidamente. As regras do jogo são as mesmas do passado. Os personagens não mudarão nos elos da disputa: de um lado as figuras que não se renovam e do outro a rendição popular.

Estamos em agosto, o aziago mês do cachorro louco, do adeus de Getúlio e JK, da renúncia de Jânio e das convenções. Em setembro a paz da Primavera. Outubro é o encontro com a realidade, da qual muitos fogem nas urnas, mas que se deparam com ela todos os meses, semanas, dias, horas, minutos e segundos por meio da incompetência administrativa, fragilidade parlamentar, inchaço da máquina pública, insegurança, corrupção, mordomia, nepotismo cruzado e tanto mais que até Deus duvida.

Pela legislação somos obrigados ao voto. Sejamos pedreiros do amanhã. Assentemos nossos tijolos na construção democrática. Que os oportunistas continuem em desvario passando seus camelos pelo buraco da agulha, o que é difícil, mas nem tanto pra quem abre mão da própria alma.

Eduardo Gomes de Andrade é jornalista
[email protected]

 

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