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“Senado suspendeu validade, mas discussão não acabou”: advogado explica alterações no Funrural

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A aprovação, ontem, de um projeto de resolução da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), suspendendo a cobrança do Funrural, conhecido como a previdência do campo, bagunçou ainda mais o entendimento sobre o já confuso tributo. Por alguns anos, o Funrural não foi cobrado dos produtores, situação que mudou, em março deste ano, com um novo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF).

Agora, com a aprovação na CCJ do Senado, o Funrural deixa de existir. É o que explica o advogado especialista em Direito Tributário da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Joaquim Rolim Ferraz. “O projeto suspende os efeitos dos artigos da lei que instituiu o Funrural. Esta aprovação na CCJ ainda tem que ser finalizada. Tem que ser transformada pelo presidente do Senado em resolução e publicada no Diário Oficial. Ou seja, caso isto acontecer, o Funrural vai deixar de existir”, esclareceu o advogado em entrevista ao portal Notícias Agrícolas.

Para Rolim, nem mesmo a Medida Provisória, em trâmite no Congresso Nacional, seria capaz de instituir novamente a cobrança. “Temos uma MP que diminui a alíquota e também estabelece um programa de pagamento diferenciado, com benefícios de redução de multa e juros do débito que o governo entende que o produtor tem com ele. Agora, ficou situação jurídica, um pouco incompreensível. Vou tentar simplificar: a Medida alterava justamente os dispositivos da lei que foram suspensos na votação do Senado. Perdeu validade jurídica”.

O advogado critica que governo e Congresso não têm seguido a Constituição Federal para instituir a cobrança. “Eles têm feito opção por adotar medidas inconstitucionais. A nossa Constituição prevê que não é possível criar um tributo da maneira que o Executivo e o Legislativo entendem. Existe um ‘script’ que não é seguido no caso do Funrural. Quando o STF suspendeu a cobrança, foi porque houve um decreto alterando as regras. Para o Supremo, não se pode alterar o Funrural por decreto. Aí o Congresso aprovou uma lei, como o STF havia recomendado, e a matéria foi levada novamente a julgamento. Desta vez, o Supremo entendeu que a cobrança estava correta”.

Ao explicar a história da cobrança, Rolim classificou o tributo como “a maior insegurança jurídica” do país. “A todo momento a gente vê ele sendo alterado. Ele foi instituído em 1971 para financiar a previdência do meio rural. Do trabalhador e do empregador. Era esta finalidade. Desde quando nasceu, já padeceu de um vicio muito sério, pois não foi instituído por lei complementar. De lá para cá, por mais de uma dezena de vezes a vigência e a eficácia foram suspensas, seja por medidas do Legislativo, seja pelo Judiciário”.

Para ele, nem a antiga cobrança da alíquota, nem a Medida Provisória em discussão são constitucionais. “O empregador paga duas vezes: a contribuição previdenciária na folha de pagamento e o Funrural sobre a venda dos produtos agrícolas. Há uma bitributação. Agora, o governo sinalizou que a implementação do Funrural vai afastar a contribuição previdenciária, de modo que passe a incidir apenas a alíquota do Funrural sobre o faturamento. Isso gera outro problema”, destacou.

“O empregador urbano está submetido a uma carga tributária de 20% para a previdência. Quando o empregador rural é submetido a uma alíquota sobre o faturamento, não está sendo tratado com isonomia, que é o exigido pela Constituição. Para exemplificar: se o empregador urbano tem 10 funcionários, e cada um recebe R$ 1 mil, são cerca de R$ 2 mil para a previdência. No caso do empregador rural, ele vai pagar sobre o faturamento. Porém, com 10 trabalhadores é possível produzir mil sacas de café, que vão gerar, fazendo uma conta básica, cerca R$ 10 mil em contribuição do Funrural. Ou seja, o empregador rural contribuiria cinco vezes mais. Isso não trata os dois com isonomia. Os dois contribuem com a arrecadação e isso precisa ser equilibrado”.

Como fica de agora em diante?

Segundo o advogado, caso a resolução seja publicada pelo presidente do Senado, nem mesmo o STF teria autonomia para instituir novamente a cobrança. Entretanto, para o advogado, a discussão sobre o tributo está apenas começando. “Isso acabou? Está resolvido? Não. Os próprios senadores podem recorrer da decisão e submeter a matéria a um novo julgamento. É o que provavelmente o governo vai tentar fazer, enviando nova MP para tratar da matéria. Vai agir inconstitucionalmente e vai fomentar a insegurança jurídica que assola o Funrural há cinco décadas”.

Caso prevaleça a resolução, os bilhões em débitos dos produtores seriam, teoricamente, extintos. O advogado, porém, prega cautela. “Se prevalecer a resolução não tem passivo, não tem débito. Como o cenário é nebuloso, é muito difícil, para não dizer impossível, que um novo tributo não seja instituído até o final do mandato do presidente Michel Temer. O produtor pode depositar judicialmente os valores, assim, se for surpreendido com alguma medida gerando o pagamento, ele tem depósito para liquidar a dívida. Deve também precificar o custo do Funrural na composição de preços de sua commodity. Não acabou a discussão”

Conforme Só Notícias/Agronotícias já informou, na semana passada, a votação da resolução havia sido adiada por falta de quórum na Comissão. O projeto de resolução suspende a execução da lei 8.540/1992, que estabelecia uma alíquota de 2,1% sobre a receita da comercialização da produção. Os produtores rurais alegam haver bitributação, já que também recolhem Previdência sobre a folha de pagamento, o que não ocorre com o empregador urbano.

O Senado tem competência para suspender a execução de leis declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, e em 2011 o STF proferiu decisão anulando a cobrança prevista na lei de 1992. No entender dos produtores rurais, o PRS de Kátia Abreu, se aprovado, sacramenta o fim da cobrança.

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), havia apresentado uma emenda ao PRS, restringindo seus efeitos à lei de 1992, e não à legislação posterior. Em 2001, foi sancionada a Lei 10.256, que substituiu as anteriores e manteve o recolhimento sobre a produção. Em 29 de março deste ano, o STF julgou constitucional a lei de 2001. Três semanas depois, a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) apresentou o PRS 13.

O relator na CCJ, Jader Barbalho (PMDB-PA), já havia dado parecer favorável ao projeto de Kátia Abreu e sido contrário à emenda de Jucá.

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