A Suprema Corte do Uruguai decidiu nesta sexta-feira pela inadmissibilidade do último recurso interposto pela defesa de João Arcanjo Ribeiro, acusado de chefiar o crime organizado em Mato Grosso e mais cinco estados, para evitar a extradição para o Brasil. Oficialmente, agora, o mafioso brasileiro já pode ser entregue às autoridades brasileiras. Ainda neste final de semana, a Polícia Federal deverá seguir com uma equipe, a partir de Brasília, para fazer a remoção do criminoso. Arcanjo está preso no Cácere Central de Montevidéu.
Condenado pela Justiça Federal em Mato Grosso, Arcanjo tentou por todos os meios permanecer no Uruguai. Uma das tentativas de evitar ser extraditado para o Brasil foi justamente uma diferença da lei penal do Uruguai e a brasileira. Lá, criminosos não podem ser julgados à revelia, ato que é permitido no Brasil. Ao aprovar sua extradição, o juiz Ricardo Vernazza pediu que a condenação no Brasil fosse anulada para processar a remoção. A corte compreendeu que “as garantias” do réu não estiveram afetadas”, segundo comunicado da assessoria da Suprema Corte do Uruguai.
Porém, prevaleceram os esforços diplomáticos. Preso por uso de documentos falsos, Arcanjo cumpriu pena e estava detido em Montevidéu como preso político. O Governo brasileiro realizou várias investidas, mostrando a incongruência das leis, a impossibilidade de revogar a pena no Brasil por porte ilegal de armas e evasão de divisas, além de formação de quadrilha. Há duas semanas, o juiz Julier Sebastião da Silva, da 1ª Vara da Justiça Federal, chegou a ir ao Uruguai, onde se reuniu com autoridades judiciárias daquele país para tentar garantir e acelerar a extradição.
A extradição de Arcanjo para o Brasil se transformou numa questão de honra para a Justiça e para o próprio Governo brasileiro. Investigado, teve sua prisão preventiva decretada pelo próprio juiz Julier Sebastião da Silva. No raiar do dia 5 de dezembro de 2002 começava então uma das mais alucinantes caçadas ao homem que antes desfilava com pompa na sociedade mato-grossense. João Arcanjo era o criminoso número 1 de Mato Grosso. Ato falho. Ao chegar na sua residência, no bairro Boa Esperança, os agentes federais – que haviam planejado a prisão de forma milimétrica – depararam com uma triste realidade: Arcanjo era um foragido.
Ainda assim, o império do “comendador” – título concedido pela Câmara Municipal e posteriormente cassado pelos vereadores – começou a ruir. Factorings foram lacradas. O símbolo de sua ostentação, a Fazenda São João, na estrada que liga Cuiabá a Jangada, foi confiscada, assim como hotéis na Flórida (EUA), emissoras de rádios, propriedades, jato, entre outros, além, claro, do desterramento do “jogo do bicho”. Arcanjo se refugiu no Uruguai. Ficou, porém, pouco tempo escondido. Em abril de 2003 foi localizado pela Interpol com documentos falsos.
Uruguai foi escolhido como refúgio para Arcanjo por razões óbvias: o criminoso, acusado de contravenção, contrabando, homicídios, sonegação de impostos e lavagem de dinheiro, mantinha uma base de operações financeiras em Montevidéu, considerado uma espécie de paraíso fiscal. Através de of-shores, o “comendador” realizou uma série de manobras financeiras que permitiu legalizar o dinheiro de suas atividades ilícitas e internalizá-las no Brasil, precisamente em Mato Grosso, através de suas factorings. O esquema de lavagem de dinheiro de Arcanjo atingiu a astronômica cifra de quase R$ 1 bilhão – o que o fez ser comparado aos grandes mafiosos da Itália.
Preso, Arcanjo tentou de tudo para ficar no Uruguai. Ele havia conseguido, inclusive, “barrar” a extradição, com interposição de recursos. É possível que até o avião da Polícia Federal chegar a Montevidéu e embarcá-lo de volta ao Brasil – para ficar em local ainda não certo – a defesa do “comendador” tente outras manobras jurídicas. Porém, até aqui, Arcanjo não tem qualquer recurso para impedir de ser entregue às autoridades brasileiras.