As queimadas este ano causam o maior desastre da história em Mato Grosso. A devastação já gerou prejuízos financeiros avaliados em mais de R$ 200 milhões. Os danos ambientais e à saúde da população, por outro lado, são incalculáveis. Hoje, a quantidade de focos (mais de 194 mil) é semelhante a registrada em 2005, ano que era considerado o mais crítico desta década pelos pesquisadores. Mas agora há acréscimo na extensão das áreas incendiadas. No Brasil, o fogo em áreas florestais levaram outros 14 estados a uma situação caótica.
Até o início deste mês, a história era escrita de forma diferente. Os piores momentos vividos pelos mato-grossenses tinham sido em 1961, 1998 e 2005. Há 39 anos, o biólogo e pesquisador Romildo Gonçalves, diz que houve incêndios de grandes proporções e 121 municípios tiveram focos de calor, mas nada comparado com 2010. Em 1998, Gonçalves cita um grande impacto no Vale do Araguaia. Mais recentemente, em 2005, os focos atingiram principalmente a região de Noroeste. Hoje, o Estado queima do Sul a Nordeste, pegando toda sua extensão.
Previsão desanimadora – As condições ambientais podem ficar ainda piores, caso as chamas não sejam controladas na região do Pantanal (Sul) ou alcancem o Parque Nacional do Xingú (Nordeste), que desde 1998 não tem queimada e possui no solo uma grande quantia de biomassa, que serve como combustível para o fogo. A área tem mais de 27 mil quilômetros quadrados.
O pesquisador Romildo Gonçalves explica que não há estrutura para combater um incêndio de grande proporções no local. "Caso o fogo se espalhe, a única saída é esperar ajuda de Deus".
Estudos ainda confirmam que este ano foi o mais quente da década no país. A temperatura, junto com a baixa umidade e a quantidade de vento, que é a maior registrada historicamente no período, favorecem a expansão do fogo. O Corpo de Bombeiros, bem como brigadistas dos municípios, encontram dificuldades para controlar os focos.
Pantanal – As queimadas acontecem tradicionalmente entre os meses de setembro e outubro na região do Pantanal, mas este ano está fora do controle. Em menos de 15 dias, a Defesa Civil Estadual já registrou vários focos de grande proporção no local.
A Fazenda São João, localizada em Poconé (512 km ao Sul de Cuiabá), foi invadida pelo fogo ontem. Bombeiros, brigadistas e servidores da Defesa Civil tentavam controlar o incêndio com uso de abafadores e bombas costais.
Na terça-feira (21), o fogo, aparentemente originário das margens do Rio Piraim, tomou conta de Porto Cercado. O perímetro do hotel Sesc Pantanal foi atingido, onde havia 200 turistas. Fagulhas atingiram um quiosque com telhado de palha, que fica na área de lazer. A fumaça tomou conta dos ambientes e os clientes foram retirados ontem. O gerente de planejamento do hotel, José Alberto Guimarães, diz que as reservas serão canceladas e não haverá registro de hóspedes na próxima semana. O tempo será utilizado pelos funcionários para a limpeza e recuperação da área de entorno.
As chamas podem aumentar devido a falta de água na região. Muitos cursos foram aterrados por estradas e acabaram secando. O exemplo desta condição extrema é a bacia Chacororé, que não tem água.
Áreas de risco – O superintendente da Defesa Civil, major Agnaldo Pereira de Souza, disse que 23 equipes estão distribuídas em locais críticos do Estado. Apenas na Fazenda São João, em Poconé, cerca de 470 pessoas, entre servidores, militares e brigadistas, tentam controlar o fogo.
Na região de Chapada dos Guimarães (67 km ao norte de Cuiabá), o incêndio ainda não atingiu o Parque Nacional, mas está nas propriedades privadas. Cinco fazendas foram atingidas pelo incêndio.
Esta semana, as chamas atingiram novamente o município de Marcelândia (710 km ao norte de Cuiabá), que há um mês já tinha enfrentando uma grande tragédia.
Em Cuiabá, depois do grande incêndio na região do Pedra 90, onde propriedades inteiras foram destruídas, os focos continuam se alastrando.
Ontem, a área do Parque Mãe Bonifácia 2 foi novamente atingida. A fumaça provocada pelo foco deixou o trânsito caótico na avenida Miguel Sutil, que chegou ser interditada. O coronel do Corpo de Bombeiros, João Rainho Júnior, disse que as chamas começaram no dia anterior e estavam aparentemente controladas. Existe a possibilidade do fogo ser criminoso. Outra hipótese é que um tronco de árvore ficou com brasa no interior e o vento fez com que fagulhas atingissem o mato seco, reativando o foco.
Entre outros municípios que enfrentam situação de perigo com as chamas estão Santo Antônio do Leverger, Diamantino, Nossa Senhora do Livramento e Acorizal.
Dados – Conforme dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe), grande parte dos focos de calor estão perto do Parque do Xingú. As cidades de São Félix do Araguaia (10.036), Ribeirão Cascalheira (8.380) e Vila Rica (7.126) estão entre as 5 cidades mais atingidas. Até o final da tarde de ontem, o Brasil tinha 707.493, sendo que 194.294 foram em Mato Grosso. Os dados são referentes ao período de 1º de janeiro a 23 de setembro. Tanto em 2005 como este ano, Mato Grosso ocupa o topo do ranking.
Prejuízo – Ainda não há um cálculo exato do prejuízo econômico das queimadas, mas o pesquisador Romildo Gonçalves acredita que seja superior a R$ 200 milhões. Ele argumenta que em Marcelândia, os danos foram de R$ 80 milhões. Na Gleba Mercedes, localizada nas proximidades do centro urbano de Sinop (500 km ao norte de Cuiabá), o valor da perda foi estimado em R$ 40 milhões e em Peixoto de Azevedo (691 km ao norte de Cuiabá), foram R$ 50 milhões.
Gonçalves afirma que os danos ambientais e à saúde do cidadão são incalculáveis porque a fumaça leva milhares de pessoas às policlínicas e hospitais com problemas respiratórios.
Proposta – A solução para o problema é investimento em educação ambiental, fiscalização e monitoramento. Gonçalves assegura que os satélites usados para monitorar os focos são os mais modernos do mundo, porém não há estrutura suficiente para atender rápido a ocorrência.
O pesquisador argumenta que caso houvesse um recurso de R$ 10 milhões, seria possível instalar 12 equipes, nos diferentes pólos de Mato Grosso, o que poderia evitar 50% dos casos. A quantia representa 5% do prejuízo econômico estimado.
A alternativa é a implantação de manejo do fogo nas áreas de preservação. O procedimento é a queima controlada de 20% do terreno, durante o período chuvoso, para reduzir a biomassa, combustível natural para os incêndios.
Nas chuvas, a umidade do ar está baixa e a temperatura controlada, bem como a incidência de ventos. A condição permite que as chamas retirem apenas a matéria morta, deixando para trás a vegetação que ainda vai brotar. "Da forma como está, o fogo destrói tudo, inclusive o alimento dos animais silvestres, sobreviventes do fogo".