Consumidores de Mato Grosso são vítimas de golpes feitos por sites que prometem retirar o nome da lista de devedores, como SPC e Serasa, sem o pagamento da dívida. Por meio de depósito bancário ou aquisição de manuais e softwares, o inadimplente teria uma suposta ferramenta para "limpar o nome". A fraude é identificada depois que o desembolso é feito e a empresa ou site desaparece, sem cumprir a promessa de habilitar a pessoa às compras a prazo novamente. Além do dinheiro, alguns mecanismos utilizados pelos golpistas ainda roubam senhas e endereços de e-mail dos "clientes".
Em Primavera do Leste (a 231 km da Capital) a pedagoga Rafaela Costa (nome fictício), 30, perdeu R$ 320 mais sua senha e e-mail na esperança de ter o nome retirado a lista de devedores dos órgãos de proteção ao crédito. Ela conta que pelo MSN (serviço de mensagem instantânea pela internet) um amigo lhe fez a proposta e disse que tinha conseguido sair do SPC/Serasa sem pagar os débitos. Com dívidas há cerca de 3 anos, a pedagoga acreditou ser a oportunidade que esperava.
Ela entrou em um site, realizou o depósito na conta bancária indicada, e então percebeu que tratava-se de um golpe. "Eu quero financiar uma casa própria e com o nome sujo isso não é possível. Por isso resolvi contratar este serviço que ainda tinha o suposto respaldo do meu amigo". Assim que desconfiou, Rafaela entrou em contato, por telefone, com o amigo e descobriu que ele também tinha sido vítima e que o MSN pelo qual se comunicou na verdade estava sob o comando dos golpistas.
"Quando descobri fiquei arrasada por ter caído na fraude. Depois procurei a Polícia para fazer o Boletim de Ocorrências (B.O.), mas não tem muito o que fazer". O MSN de Rafaela também está na mão dos golpistas. Ela afirma nas investigações foi descoberto que a conta corrente em que fez o depósito é em nome de C.F.C, mas segundo o funcionário da delegacia, o beneficiário também pode ser uma outra vítima. A conta poupança, da Caixa Econômica Federal, fornecida pelos golpistas é da agência 0147, número 0022031-4, de Pouso Alegre, Minas Gerais.
Outra vítima – Eduardo Gezizier, 21, de Campo Novo do Parecis (a 396 km de Cuiabá), também perdeu os dados do e-mail e o MSN, mas não chegou a fazer o depósito porque percebeu que havia sido lesado virtualmente ao cadastrar o endereço e a senha no site www.minhadivida.com.br. "Quando meu amigo ofereceu o serviço não desconfiei, mas depois que entrei no site percebi que se tratava de uma fraude".
O endereço ainda está ativo na rede e quando o usuário seleciona o serviço de consulta, abre uma página que pede os dados do e-mail. É neste momento que o site rastreia o MSN e os golpistas passam a conversar com a lista de contatos do inadimplente. Depois, eles calculam quanto irá custar para retirar o nome dos sistemas de proteção ao crédito e fornece o número da conta bancária para que o depósito seja feito.
Outro site foi encontrado pela reportagem, o www.consumidordefesa. com, e oferece um manual eletrônico com informações sobre como "limpar" o nome utilizando "brechas da lei". Segundo informações postadas no portal, a pessoa compra o "livro", segue as instruções e aguarda 15 dias para o resultado. O manual é vendido por R$ 49,90, e está em promoção (preço anterior era R$ 79,90). A entrega é feita via e-mail, e a encomenda pode ser paga via boleto, transferência ou depósito bancário e cartão de crédito.
Ao entrar em contato para pedir informações sobre um telefone que pudesse detalhar melhor o procedimento ou o contato de outros clientes que tiveram sucesso, a resposta foi curta (ver quadro ao lado), informando apenas a legalidade da ação, mas não forneceu qualquer outro contato.
Uma rede golpista – O superintendente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Cuiabá (CDL), Nelson Soares, afirma que é comum que clientes procurem o SPC para perguntar se este tipo de serviço é legal e confiável. "Atualmente há muitas empresas que criam sites para roubar os consumidores. O procedimento para sair da lista do SPC/Serasa é simples. Se pagar a dívida, o nome é retirado automaticamente. Mas sem pagar o débito não é possível, não existem alternativas legais, como argumentam os fraudadores".
Soares revela que, assim que recebem uma denúncia informam a central nacional do SPC, porém a maioria dos sites é registrada em outros países, o que dificulta o rastreamento. A superintendente do Procon Estadual, Gisela Simona Viana, explica que inserção do nome do consumidor em débito nos bancos de dados de proteção ao crédito é legal e prevista tanto no Código de Defesa do Consumidor (CDC) quanto na Constituição, mas que é preciso seguir alguns critérios antes de cadastrar o CPF do inadimplente.
"A empresa só pode solicitar a adesão se houver dívidas comprovadamente em atraso e o consumidor for avisado com antecedência sobre a inclusão na lista de devedores. Caso siga estes requisitos, a inclusão é considerada ilegal". De acordo com Gisela, quando o consumidor se julgar lesado, o correto é procurar um advogado de confiança ou a Defensoria Pública. "A Justiça pode ser acionada em casos de danos ao consumidor, mas não recomendamos a contratação de qualquer serviço ou empresa desconhecida".
Nelson Soares, da CDL, explica que existem profissionais sérios que oferecem seus serviços de maneira legal para aqueles que se julgam injustiçados. "Têm advogados que disponibilizam seus serviços apenas para quem foi inserido no banco de dados de forma ilegal, e isto não tem problema. O erro está no golpe que outras empresas aplicam prometendo um serviço que não existe".
O superintendente da CDL ainda revela que há pouco tempo, alguns consumidores recorriam à Justiça alegando desacordo comercial e solicitava a retirada do nome. "A máfia das liminares não existe mais. A Justiça está atenta para a má intenção e só manda excluir o nome daqueles que realmente comprovam que houve problema na relação comercial".
O vice-presidente da Federação do Comércio de Mato Grosso (Fecomércio), Roberto Peron ressalta que sempre haverá consumidores maus intencionados e serviços para atendê-los. Mas que na verdade os mais lesados na tentativa de retirar o nome dos cadastros de inadimplência são os próprios consumidores, que têm o dinheiro roubado na tentativa de recuperação de crédito fácil.