Cerca de 3 mil pessoas participaram da 11ª Parada da Diversidade Sexual de Mato Grosso realizada ontem à tarde, em Cuiabá, debaixo de chuva, com intuito de reivindicar direitos civis iguais aos heterossexuais, como garante o texto da Constituição Federal de 1988, o que na prática não acontece. Nesta edição, o evento trouxe como tema "Estado laico: Sua religião não é a nossa lei", uma posição contra o preconceito religioso aos homossexuais demonstrado através de boa parte dos representantes políticos e líderes religiosos locais e nacionais.
E, curiosamente, gays, lésbicas, travestis, transexuais e simpatizantes que participavam do evento dividiram o mesmo espaço com um grupo religioso da Assembleia de Deus, na praça Ipiranga, ponto de concentração da Parada antes da caminhada em direção à Praça Santos Dumont, na avenida Getúlio Vargas. O motivo é que um grupo de 50 evangélicos realizava um culto no coreto situado bem no meio na praça.
Logo no início, quando o público LGBT começava a se concentrar na praça, Clóvis Arantes, representante em Mato Grosso, da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ALGBT) subiu no trio elétrico, utilizou o microfone e disse, em alto e bom tom, que a Parada da Diversidade estava marcada há 3 meses para ocorrer na praça Ipiranga no dia 23 de novembro às 14h e portanto, o evento iria acontecer com ou sem a presença dos evangélicos. E aconteceu, sem qualquer incidente entre ambos os grupos. A Polícia Militar e dezenas de agentes de trânsito (amarelinhos) trabalharam para garantir a segurança dos participantes e também dos motoristas.
O inusitado ficou por conta de um pastor que participava do culto. Ele passou a percorrer toda a praça abordando grupos de gays e lésbicas com a ideia de "pregar a palavra e tentar converter os homossexuais". Sem sucesso. Entre às 14h30 e 16h45, tempo em que a praça Ipiranga foi ponto de concentração da Parada Gay, o pastor abordou dezenas de pessoas, mas não conseguiu convencer nenhuma a sair de perto do trio elétrico onde eram tocadas músicas animadas e ocorriam os discursos de ativistas da causa LGBT, para ir participar do culto no coreto, a menos 50 metros.
Por parte da Parada Gay, o que chamou atenção, inclusive dos evangélicos, foi uma intervenção teatral protagonizada por três ativistas da causa gay que encenavam a intolerância religiosa que ainda predomina no país. Um dos personagens representava o poder público e para isso segurava uma coleira amarrada à 2ª personagem que por sua vez estava pintada com tinta vermelha pelo corpo simbolizando a comunidade LGBT . Acuada e sem saída, ela e era agredida pela terceira personagem, no caso uma pessoa homofóbica que era incitada pelo 1º ator (poder público) a agredir cada vez mais. A intervenção percorreu vários pontos da praça e chocava à primeira vista. Principalmente, pelas investidas de forma inesperada e brutal do "agressor" contra a "vítima" que amarrada e sem tem como fugir, caía no chão e era agredida.
Para fazer jus ao tema que de nenhuma religião no Brasil é lei que precisa ser seguida por ninguém e muito menos imposta contra vontade, principalmente aos homossexuais, o cartaz de divulgação do evento, foi a estátua da Liberdade beijando na boca o símbolo da Justiça, a deusa Têmis, com a frase: "Estado laico: sua religião não é nossa lei".
Na parada gay, também houve vaias e muitas críticas ao pastor e deputado federal Marco Feliciano (PSC) que preside a Comissão de Direitos Humanos da Câmara e luta contra os direitos dos homossexuais no Brasil. Sua atuação contra o segmento LGBT mais recente, ocorreu na surdina, durante sessão esvaziada na última quarta-feira (20) feriado pelo dia da Consciência Negra, quando ele e os demais membros da Comissão votaram, em menos de 30 minutos, pela suspensão da resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de maio, que proíbe que cartórios se recusem a registrar a união entre duas pessoas do mesmo sexo.
O recado ficou claro nas falas dos vários representantes de entidades que lutam por políticas públicas para a população LGBT. Eles pediram a aprovação do Projeto de Lei da Câmara número 122 de 2006, que visa criminalizar a discriminação motivada por orientação sexual ou identidade de gênero, cometida contra homossexuais, bissexuais ou heterossexuais por conta de sua opção sexual. Se aprovado, irá alterar a Lei de Racismo para incluir tais discriminações no conceito legal de racismo – que abrange, atualmente, a discriminação por cor de pele, etnia, origem nacional ou religião.
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Nesse ano, a 11ª Parada da Diversidade Sexual trouxe um padrinho no lugar da madrinha, figura feminina que historicamente esteve presente nas outras 10 edições do evento. O escolhido como padrinho foi o vereador Allan Kardec (PT) em virtude de seu trabalho que vem sendo realizado na Câmara de Cuiabá em prol da comunidade LGBT. Ele puxa as discussões e cobra do poder público municipal a implantação e execução de políticas públicas que garantam direitos aos homossexuais, à educação, saúde, segurança, lazer, mercado de trabalho e outras questões. Allan deixa claro que é heterossexual, mas não aceita preconceito e violência contra gays e lésbicas, pois são cidadãos que pagam impostos, também representam a sociedade cuiabana e precisam de respeito e de ser amparados por políticas públicas que funcinem efetivamente garnatindo-lhes direitos civis como ocorre com os heterossexuais.
As cobranças têm surtido resultados, pois o prefeito Mauro Mendes (PSB) comprou a ideia e colocou o secretário municipal de Assistência Social de Desenvolvimento Humano, José Rodrigues Rocha Júnior como responsável para criar num futuro bem próximo o Conselho Municipal de Políticas para o público LGBT. As conversas estão adiantadas e o secretário que também participou da Parada da Diversidade e fez discurso no palco montado na Praça Santos Dumont, ressaltou que o projeto de lei para instituir o Conselho já está sendo elaborado. O vereador Arilson da Silva (PT) também participou do evento e soma forças nas discussões por direitos ao público LBGT de Cuiabá.