No ano em que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) completa 70 anos, diversas iniciativas circulam no Congresso Nacional visando a modificar ou mesmo a retirar direitos conquistados pelos trabalhadores. Essas propostas incluem projetos de lei e propostas de modificação de artigos da Constituição que asseguram direitos trabalhistas.
Desde a promulgação da Constituição de 1988, os trabalhadores têm convivido com o questionamento destas propostas. Os argumentos utilizados são os de que a legislação onera a criação de empregos, devido aos encargos sociais. Mas há também argumentos que defendem o fracionamento das férias, alterações no regime previdenciário e no mecanismo do 13º salário, entre outros.
A Agência Brasil ouviu representantes de quatro centrais sindicais a respeito destas propostas. Na visão dos representantes da Central Única dos Trabalhadores, da Força Sindical, da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e da Central Sindical e Popular/Conlutas (CSP-Conlutas), o Congresso está empenhado em defender os interesses dos empresários e esquecendo de legislar em favor dos trabalhadores.
"O fato de existir a CLT garante o mínimo de direitos para os trabalhadores. Mas, toda hora se ouve os empresários alegarem que a mão de obra no país é cara. Mas não é verdade. O empresariado inclui os direitos dos trabalhadores no tal do custo Brasil, como se o país para ir pra frente tivesse que tirar os direitos do trabalhador, como FGTS, férias etc.", argumenta o presidente da CTB, Wagner Gomes.
Entre as proposições com reflexo no mundo do trabalho em tramitação no Congresso, os sindicalistas destacaram o projeto de Lei (PL 4330/2004) que visa a regulamentar a terceirização tanto no setor privado quanto no setor público. Sob o argumento de que o projeto visa a fortalecer o empreendedorismo, a proposta permite que o trabalhador constitua empresa de prestação de serviço, o que os sindicalistas chama de PJ (pessoa jurídica) ou empresa de um homem só.
Caso o projeto seja aprovado, o empregado se transforma em empresa ou pessoa jurídica, mas continua cumprindo horário, recebendo ordens e exercendo as mesmas atividades de antes, nas dependências do contratante. A legislação atual considera que, quem presta serviço nessas circunstâncias, em atividade não eventual, é considerado empregado, segundo o artigo 3º da CLT.
"Esse discurso é a maior ameaça: se não fosse a CLT teríamos perdidos alguns direitos. Isto só não se consolidou porque eles constam na CLT e na Constituição", observa o secretário executivo da Força Sindical, João Carlos Gonçalves.
Para o secretário de Organização e Política Sindical da CUT, Jaci Afonso, a "terceirização é a maior ameaça para a CUT do ponto de vista da legislação, pois enfraquece o poder de negociação do trabalhador que vai ter de vender cada vez mais barato a sua mão de obra e não terá mais direitos trabalhistas, como férias, 13º salário".
Atualmente não há legislação que discipline a terceirização. Os sindicalistas defendem a regulamentação, mas não da forma que está sendo proposta. Eles argumentam que se o projeto virar lei também será derrubada a norma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que veda a contratação de terceirizados para a atividade fim das empresas. "Esse é o risco que o governo Lula vetou. Mas há o risco de o Congresso derrubar o veto: o projeto do Artur Maia [do PMDB-BA e relator do projeto] tenta retomar isso" complementa Afonso.
Os sindicalistas também destacaram os projetos de Lei 948/11 e 951/11, ambos sob exame da Câmara. O primeiro, do deputado Laércio Oliveira (PR-SE), prevê que, no processo de rescisão do emprego, a empresa pode inserir uma cláusula em que o empregado abdique do direito de reclamar na Justiça do Trabalho qualquer direito trabalhista que não tenha sido expressamente ressalvado no momento da rescisão contratual.
O segundo, do deputado Júlio Delgado (PSB-MG), cria o Simples Trabalhista, que permite a redução de direitos dos empregados de pequenas e microempresas. O projeto prevê a redução de 8% para 2% da alíquota do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Ele cria uma categoria diferenciada de trabalhadores, pois acaba com a poupança que protege o trabalhador demitido sem justa causa. O projeto também prevê o gozo de férias fracionado em até três vezes, relata o assessor técnico do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), André Luís dos Santos.
Para o membro da executiva da CSP-Conlutas, Paulo Barela, as tentativas de flexibilização dos direitos dos trabalhadores têm sido recorrentes desde o governo FHC até hoje. Barela inclui entre estas tentativas o fator previdenciário, dispositivo que reduz o benefício de quem requisita aposentadoria por tempo de serviço. "Os trabalhadores acabam permanecendo no emprego por mais tempo em função do corte. A gente defende que o regime de aposentadoria deve ser o de tempo de serviço", observa Barela.
Criado pelo governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o fim do fator previdenciário foi aprovado pelo Congresso em 2010, mas foi vetado pelo então presidente Lula. O fim do fator previdenciário é uma pauta comum para as centrais sindicais. Para Barela, o momento tem de ser de pressão pelo fim do fator previdenciário. Ele também se posicionou contra um projeto proposto pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC paulista, em 2011 e que trata do Acordo Coletivo Especial. Em tramitação na Câmara dos Deputados, o projeto pretende alterar a legislação trabalhista ao autorizar os sindicatos a negociar com as empresas acordos coletivos cujas cláusulas desconsiderem a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O projeto, que conta com apoio da Central Única dos Trabalhadores (CUT), tem causado polêmica no movimento sindical.
"Na medida em que ele possibilita que o acordado possa valer sobre a lei, ele abre espaço para o aumento de banco de horas em vez do pagamento de horas extras, a empresa também poderá pleitear a diminuição de salários, jogando com o medo do trabalhador de perder o emprego", assinala Barela. O projeto também é combatido pela Força Sindical e CTB. "Somos contra: a primeira coisa que eles vão querer fazer é baixar o salário", adverte Wagner Gomes.