Falta de médicos e até utilização de soro vencido. Essa é a realidade da população cuiabana que depende do atendimento nas policlínicas da capital. Nesta quinta-feira, a reportagem percorreu as unidades de saúde e os relatos dos pacientes são sempre os mesmos, de peregrinação para conseguir uma consulta.
Um dos casos mais graves é denunciado por Regiane Roca dos Santos, que passou na madrugada desta quinta-feira (03) por uma situação delicada com a avó do marido, Cecília Juliana de Oliveira. A idosa chegou à Policlínica do Planalto às 21h30. Duas horas depois, Regiane conta que foi até a unidade de saúde e quando entrou percebeu que o soro aplicado na paciente estava vencido. "Comecei a reclamar e ninguém fez nada. A enfermeira, inclusive, tentou arrancar o soro da minha mão".
Regiane conseguiu pegar o frasco e foi até o Centro Integrado de Segurança e Cidadania (Cisc) do Planalto onde registrou um boletim de ocorrência e afirma que entrará com uma ação na Justiça contra a Policlínica. Ela também conta que após o ocorrido com Cecília, a enfermeira cancelou todos os outros atendimentos. "Tinha gente chorando de dor e ela disse que ninguém mais seria atendido até que conseguissem contatar os superiores".
Regiane afirma que as enfermeiras jogaram no lixo mais frascos de soro vencidos e que muitos outros pacientes que já tinham ido embora utilizaram o mesmo lote.
Os problemas também ocorrem na recém-inaugurada Policlínica do CPA I, Doutor Henrique de Aquino. O local é um exemplo de uma boa obra. Fachada decorada e pintada, recepção com ar condicionado, salas de triagem com móveis e piso novos. Porém, mesmo com todas as benfeitorias estruturais falta o principal na unidade, um atendimento de qualidade. Ao chegar à recepção durante esta quinta-feira, o paciente já recebia a notícia de que não havia clínico geral. "Me mandaram procurar a Policlínica do Verdão ou do Coxipó. Eles não explicam por que não tem médico, só falam para procurar atendimento em outro lugar. Estou com dor na nuca e tontura, acho que por causa da pressão alta, mas eles não podem passar medicamentos sem a prescrição do médico", conta a balconista Luciene da Conceição.
A única pediatra que estava atendendo na unidade nesta quinta-feira precisou acompanhar um paciente ao Pronto-Socorro Municipal de Cuiabá. "Muita gente foi embora, porque aconselharam a voltar a tarde, pois não deram previsão da volta da médica. Só tinha uma pediatra e ela foi acompanhar o paciente, agora é esperar", reclama a autônoma Josiane Leite Pimenta.
Situação complicada também na Policlínica do Coxipó, Doutor José Eduardo Vaz Curvo. Em uma pequena recepção, com pouca iluminação e quase nenhuma ventilação, cerca de 50 pessoas aguardavam atendimento. A notícia do dia para os presentes não foi boa, pois dos 4 médicos que deveriam estar atendendo, apenas 2 foram trabalhar. Como a ordem de atendimento não depende apenas da ordem de chegada, mas da gravidade da doença, muitos pacientes esperam horas na fila por um atendimento de poucos minutos com o médico.
Para a recepcionista Caroline Portela, além de médicos a Policlínica também precisa melhorar o atendimento aos pacientes. "Faltam médicos para atender a gente, mas o pior mesmo é a recepção, que mal dá informações e ainda nos tratam mal. Outro problema é que quando a fila está grande os pacientes mais graves vão passando na frente e a gente fica esperando por horas". Com sua filha doente no colo, Caroline já esperava a uma hora e meia sem nenhuma previsão de atendimento.
Outro lado
A assessoria da Prefeitura de Cuiabá informou que em 9 dias será lançado um plano emergencial detalhado para desafogar o Pronto Socorro Municipal que inclui equipar as policlínicas e Programas de Saúde da Família (PSF), com a contratação de médicos e vigilantes, entre outras medidas.
Secretário municipal de Saúde, Kamil Fares informou que será investigada a denúncia de soro vencido. Ele afirma que precisa de mais informações sobre o caso, inclusive o tipo do soro, e destaca que se a enfermeira jogou fora outros fracos não tomou a atitude correta, pois o material precisaria ser analisado. "As pessoas precisam ser melhores treinadas. Infelizmente, nosso pessoal nem sempre tem perfil de qualificação".
Afirma ainda que qualquer incidente em policlínica será feito um registro de ocorrência. Quanto à falta de médicos, afirma que hoje falta cerca de 70 nas policlínicas e um concurso público já será realizado, com expectativa de provas em 30 dias, para contratar cerca de 90 profissionais. O número maior que o déficit já é prevendo a cobertura de férias.