A justiça parece ser, cada vez mais, o meio encontrado por pais que querem ver seus filhos matriculados em uma creche do município. Com uma fila de espera de cerca de 1,5 mil crianças, de acordo com uma fonte de Só Notícias, alguns pais têm ingressado com ações contra a prefeitura para a obrigar a cumprir o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e garantir a vaga dos pequenos. Em decisão divulgada no Diário Oficial que circulou ontem, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça manteve inalterada uma decisão de 1ª instância e fixou uma multa de R$ 1 mil por dia, caso o Executivo Municipal não garanta a matrícula de uma criança.
A decisão foi proferida na 5ª Vara Cível de Sinop e determinou que a prefeitura disponibilizasse vaga para a criança, próximo à residência dos pais, em um prazo de 48 horas. A procuradoria jurídica da prefeitura recorreu, então, ao Tribunal de Justiça, alegando que “não ficou demonstrada a extrema urgência da medida e a falta de condições de ambos os genitores do menor”. O Executivo também destacou que não há vagas na creche próxima à residência do menor, e que, portanto, “sua matrícula implicaria excesso de crianças por sala e más condições de atendimento em razão da quantidade de profissionais”.
Os argumentos não foram acatados pela desembargadora e relatora do processo, Maria Erotides Baranjak (foto). “Verifico que o primeiro requisito – prova inequívoca do fato título do pedido que convença da verossimilhança da alegação – foi devidamente preenchido, uma vez que a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 227, dispõe expressamente que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança o direito à educação”.
A relatora também destacou que “da mesma forma ocorre com relação ao segundo requisito – fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação – porque os prejuízos advindos da espera do julgamento de mérito da ação de base são incontrovertidos”, apontando ainda que “desse modo, é certo que o deferimento do pleito antecipatório pelo Juízo singular se mostra acertado”.
Os desembargadores seguiram o voto da relatora e negaram, por unanimidade, o recurso da prefeitura, mantendo assim, inalterada a decisão do juízo singular que obriga a prefeitura a matricular a criança na creche.
Conforme Só Notícias já informou, os desembargadores da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça reexaminaram uma sentença semelhante de 2012. Naquela ação a prefeitura foi obrigada a matricular duas crianças em creches próximas de suas residências, também sob pena de multa diária de R$ 1 mil. Os desembargadores decidiram, por maioria, reconhecer o direito à educação, “sobretudo aos cuidados de menores em creche municipal”, mas advertiram que não se pode reconhecer tal direito “e compelir a entidade a matricular a criança, se não há número de vagas”.
O entendimento do tribunal foi baseado em um ofício encaminhado, na época, no qual a Secretaria Municipal de Educação justificava que não poderia atender o pedido de matrícula “em razão da ausência de vagas”. A prefeitura havia afirmado que as crianças seriam cadastradas na fila de espera e, posteriormente, assim que houvesse disponibilidade de oferta de vagas, seriam matriculadas. Para os desembargadores, embora as crianças tenham direito assegurado à educação, “outras também o têm, e certamente aguardam a sua vez na lista de espera, não sendo razoável favorecer as menores interessadas em detrimento dos demais”.
O relator do processo, desembargador José Zuquim Nogueira, ainda lembrou que “se não há vagas, não é prudente, simplesmente, ordenar a matrícula das menores, na medida em que o Estado só teria como cumprir a ordem matriculando um número excedente de alunos, o que seria prejudicial e colocaria em risco a segurança de todas as crianças. Desse modo, caso as interessadas, representadas por sua genitora, atinjam o seu intuito, estarão desrespeitando o direito das demais crianças que também aguardam o surgimento de novas vagas nesta instituição de ensino”. Para os desembargadores, “o direito, neste caso, pode se convolar em prejuízo ao desenvolvimento do menor, bem como em transtornos diversos para toda a comunidade escolar”.