O ex-prefeito do município de Brasnorte, Ezequias Vicente da Silva, que esteve no cargo entre 1997 e 2000, foi condenado a ressarcir integralmente R$ 1.332.589,78 aos cofres públicos municipais, além de pagar multa no valor de R$ 611.846,50 por atos de improbidade administrativa. Ele também foi condenado à perda de função pública, à suspensão dos direitos políticos por cinco anos e à proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de cinco anos. A sentença foi proferida pelo juiz Francisco Ney Gaíva, titular da Comarca de Brasnorte.
O município alegou que a auditoria referente à gestão de Ezequias constatou uma série de irregularidades, entre elas o desaparecimento de bens pertencentes ao patrimônio público municipal, no valor total de R$269.806,73. O sumiço foi apurado em março de 2001, quando ele já não ocupava mais o cargo. Além disso, mesmo sabendo que não poderia assumir obrigações que não pudessem ser pagas no final do exercício de 2000 – quando a Lei de Responsabilidade Fiscal já estava em vigor -, o ex-prefeito contraiu empréstimos em nome o município no último ano de mandato. Ele deixou para o seu sucessor restos a pagar no valor de R$1.082.915,71. Conforme informações da ação, o passivo deixado pelo ex-prefeito corresponde a quase dois anos de arrecadação do município.
Outras acusações feitas são a apropriação indébita de recursos do INSS; a existência de grande quantidade de gastos sem justificativa, tais como despesas com restaurante e hospedagens; desvio de verbas provenientes do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF); atraso no pagamento dos salários dos servidores e a não-aplicação do percentual de 25% da receita em educação. As contas referentes ao exercício de 2000 foram rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado.
Na contestação, o ex-prefeito alegou, no mérito, que o município narrou de forma vaga os fatos que teriam sido praticados por ele durante a gestão em que foi prefeito, o que dificultou o exercício da defesa.
Em relação ao desaparecimento de bens, o juiz Francisco Gaíva explicou na decisão que o agente público que age negligentemente ao não conservar o patrimônio público deve responder nos termos da lei de improbidade administrativa (Lei 8.429/92). “De fato, os bens públicos pertencem à coletividade, devendo o gestor, como representante dessa coletividade, empenhar esforços no sentido de garantir a integridade física do patrimônio público. (…) Observa-se o comportamento negligente do requerido no trato da coisa pública, na medida em que o mesmo não empreendeu o necessário cuidado para a conservação do patrimônio público”, assinalou.
Para o magistrado, o ex-prefeito não agiu como um bom administrador no sentido de empreender esforços a fim de fiscalizar seus subalternos para que os mesmos zelassem pelo patrimônio público. “Restou demonstrado que o requerido, de forma negligente, deixou de manter a efetiva e permanente conservação dos bens públicos. Em conseqüência, houve uma perda patrimonial do município em relação aos valores agregados ao acervo patrimonial, daí exsurgindo o prejuízo. (…) E por tal conduta deve o requerido ser responsabilizado nos termos da Lei Especial, ressarcindo o ente público prejudicado”.
Sobre a contração de dívidas no final do mandato e os restos a pagar deixados para o sucessor, o juiz destacou que houve violação ao artigo 42 da Lei Complementar nº. 1001/2000, que estabelece que ‘é vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres de seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito’.
“O requerido contraiu dívidas após o dia 04/05/2000 – data em que passou a viger a Lei de Responsabilidade Fiscal – de modo que o saldo do valor referente a ‘restos a pagar’ teve um crescimento insuscetível de ser quitado dentro do exercício financeiro de 2000, notadamente, último ano de mandato do requerido. Tal fato comprometeu sobremaneira a gestão sucessora, que recebeu a Prefeitura Municipal de Brasnorte/MT com uma dívida em aberto no valor de R$ 981.754,51. (…) Visualiza-se nitidamente que o ativo orçamentário era sempre muito inferior ao passivo orçamentário (…) O fato de a obrigação ter sido contraída no período vedado pelo artigo 42 da Lei Complementar nº 101/2000 e sem provisão de caixa, induz à conclusão de que o requerido agiu de má-fé, o acarretou danos aos cofres públicos”, observou o juiz.
Além disso, ficou comprovado que o prefeito procedeu aos descontos previdenciários na folha salarial dos servidores, porém não recolheu aos cofres do Instituto Nacional de Seguridade Social. Os descontos realizados na folha de pagamento dos servidores eram escriturados contabilmente como receita extra-orçamentária, “o que demonstra a má-fé do demandado, restando claro que o mesmo agiu com dolo”.
“A conduta do requerido consistente em reter as verbas previdenciárias da remuneração dos servidores, e não recolhê-las ao órgão respectivo – no caso o INSS – caracteriza nítido comportamento desonesto do mesmo frente à Administração Pública, e viola os princípios da legalidade e da moralidade administrativa, o que demonstra violação dos bens jurídicos tutelados pela Lei de Improbidade Administrativa. (…) A má-fé do requerido demonstra o dolo do mesmo. Tal conduta compromete os princípios éticos e morais a serem observados pelo administrador público, pois retrata desonestidade do demandado frente às obrigações legais”, assinalou.
O ex-prefeito também foi condenado por ter realizado grande quantidade de despesas referentes a gastos realizados em Cuiabá, sendo que ele tinha recebido diárias para essas mesmas viagens, o que dobrou o valor dos gastos públicos. Ele teve contas com bares, restaurantes e hotéis pagas cumulativamente pelo poder público através de empenhos realizados por ele mesmo. “Além de violar expressa disposição legal, o requerido com tal conduta fez aumentar as despesas públicas, haja vista que o Município pagava as diárias e arcava, de forma cumulada, com as despesas de alimentação e estadias em hotéis. Portanto, merece veemente censura tal agir administrativo”, explicou o juiz Francisco Gaíva. Só com esse tipo de despesa o ex-prefeito gastou R$ 32.116,52 mil.
Ficou comprovado o desvio de recursos provenientes do FUNDEF e a utilização dos meses para pagamento de despesa diversa da prevista em lei para o fundo e o atraso injustificado de cinco meses de salários e no pagamento do 13º. O ex-prefeito também foi condenado a pagar despesas judiciais, custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 100 mil. A sentença foi proferida nesta terça-feira (6 de novembro) e é passível de recurso.