Além disso, Mato Grosso está bem abaixo da média nacional quando se trata de casos novos protocolados nas comarcas, o que significa que a demanda de trabalho é menor do que em outros Estados. Por outro lado, a Justiça de 1ª Instância em Mato Grosso tem uma das maiores taxas de congestionamento do país (9º lugar), que representa os processos que entram mas não são julgados no mesmo ano, o que aumenta o estoque de ações judiciais que são acumuladas nos fóruns.
Pelos números do CNJ os investimentos na Justiça de Mato Grosso, inclusive quanto ao número de magistrados e de pessoal auxiliar, são maiores do que em outros Estados e favoráveis a uma justiça célere e eficiente. Mas o que está faltando para atingir a celeridade desejada pela população, na tramitação dos processos? Qual o principal gargalo do Judiciário mato-grossense? Onde está a solução?
Além de analisar os gráficos produzidos pelo CNJ, a reportagem ouviu o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil e a presidência do Tribunal de Justiça sobre a qualidade da Justiça de Primeira Instância em Mato Grosso, que acumula hoje um estoque de 660,6 mil processos.
Outra situação que poderia justificar a morosidade da Justiça é o volume de novos processos nas 79 comarcas do Estado, que caracteriza o aumento do volume de trabalho. Em Mato Grosso chegam a cada ano 5,65 novos processos para cada 100 mil habitantes, uma média muito inferior à nacional. A título de comparação com os estados vizinhos, Mato Grosso é superado em 65% por Mato Grosso do Sul, que recebe a cada ano 9,43 processos novos. A carga de trabalho aqui está 20% inferior à de Goiás, que tem 6,82 ações protocoladas a cada ano. E fica 31% abaixo do Distrito Federal, que ganha a cada ano 7,72 novas ações judiciais.
Custos – A Justiça de Mato Grosso custa R$ 160,05 por habitante a cada ano, e figura entre as três mais caras do país, perdendo apenas para o Amapá e o Distrito Federal. A Justiça do Rio Grande do Sul, por exemplo, considerada uma das mais céleres do país, tem uma despesa média anual de R$ 111,67 por habitante, e ocupa o 11º lugar no ranking nacional.
Mato Grosso gasta o dobro do que o vizinho Goiás e está 59% acima da média nacional, no que diz respeito ao custo da Justiça para os cofres públicos.
OAB – O advogado Francisco Faiad, que presidiu a Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso (OAB/MT) por seis anos, afirma que, além dos gastos do Poder Judiciário, as custas judiciais também estão entre as mais caras do país.
Ele informou que a OAB protocolou duas ações diretas de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal contestando os valores das custas judiciais cobradas pelo Poder Judiciário de Mato Grosso. “É uma das cinco mais caras do Brasil, os valores cobrados são exorbitantes. As custas cobradas em Mato Grosso, hoje, inibem inclusive o acesso do cidadão ao Poder Judiciário”, protestou.
TJ responde – O Tribunal de Justiça garante que os números do CNJ não refletem a realidade, porque são calculados no senso populacional feito de dez em dez anos. No documento chamado Justiça em Números, o CNJ explica que calcula o número de habitantes com base na estimativa populacional anual feita para estados e municípios. Ainda assim, diz o TJ, a estimativa é feita de forma homogeneizada para todos os estados, e não leva em consideração o crescimento populacional de cada um. Além disso, informou o TJ, Mato Grosso tem um custo maior porque, depois da divisão do Estado, ficou com os custos dos aposentados de Mato Grosso do Sul.
Morosidade
Ao contrário do que afirma a Ordem dos Advogados do Brasil e a própria população, o Ministério Público diz que a Justiça de Primeiro Grau em Mato Grosso não é morosa, mas se enquadra em um padrão razoável de agilidade.
“Eu acho que a Justiça de Mato Grosso, se você comparar com a média nacional, ela é razoável. Isso não significa que nós não devemos melhorar. Porque, se comparar com o que a população espera do Judiciário, o andamento dos processos está muito aquém daquele esperado. A aventada morosidade do Judiciário, na minha opinião, é mais localizada”, destacou o procurador-geral de Justiça, Marcelo Ferra.
Embora negue o excesso de morosidade da Justiça de 1ª Instância, o procurador Marcelo Ferra credita essa diferença no tempo de tramitação dos processos à concentração de investimentos no Tribunal de Justiça, em detrimento das comarcas. “A estrutura em Segunda Instância é muito superior à estrutura em Primeira Instância. O investimento no Tribunal e nas comarcas maiores é maior do que nas comarcas menores”, concluiu.
Para a OAB, a Justiça de Primeiro Grau “é lenta, muito lenta”. Conforme o advogado Francisco Faiad, há duas realidades em Mato Grosso. “No Primeiro Grau o Poder Judiciário de Mato Grosso está muito aquém da média nacional, enquanto que no Segundo Grau ela está acima da média nacional”.
TJ responde – O juiz auxiliar da presidência do Tribunal de Justiça, Irênio Lima, destacou que o Tribunal de Justiça é o mais célere do país. Em relação ao serviço prestado na 1ª Instância, ele alegou que a dimensão territorial do Estado, aliado ao aumento do número de comarcas para preencher essas lacunas e levar a Justiça para perto do cidadão, resultou também em maior volume do processos e maior demanda para o Judiciário.
Número de juízes
Mato Grosso é o sexto estado com maior volume de juízes, em um cálculo do CNJ que considera a proporcionalidade em relação ao número de habitantes. O Estado tem hoje 221 magistrados. O dado causou surpresa na OAB/MT, que aponta déficit de juízes na Primeira Instância. Já o Ministério Público aponta falha na gestão dos recursos humanos.
O Tribunal de Justiça admite um déficit de 76 juízes, que será parcialmente coberto com o recém lançado concurso para contratar 43 magistrados. Mas o advogado Francisco Faiad, que acompanhou os problemas do Judiciário nos últimos seis anos como presidente da OAB/MT, disse que a entidade fez um levantamento e descobriu um déficit de 110 juízes em Mato Grosso. “Tem juízes do interior atendendo uma ou mais comarcas. E em Cuiabá, se você fizer uma visita ao Fórum, vai ver que vagas que eram ocupadas por juízes que foram alçados ao cargo de desembargador há cinco anos, até hoje não foram preenchidas por novos magistrados. Elas estão sendo atendidas por substituição, e isso aumenta a morosidade”.
O procurador geral de Justiça, Marcelo Ferra, discorda da OAB. “Não acho que o número de juízes em nosso Estado é pequeno. Se compararmos com a média nacional, o número de juízes por habitante em Mato Grosso é muito superior. O que tem que se tomar cuidado é para não haver uma concentração de magistrados nas comarcas maiores em detrimento do interior do Estado”.
Para o MP o problema é má distribuição da estrutura. “O que a gente faz no Ministério Público, e tem que existir no Judiciário, é uma distribuição equitativa da deficiência. Ou seja, se está faltando magistrado ou servidores, tem que faltar um pouco em cada lugar, não pode deixar descoberto tão somente as comarcas menores”, disse Marcelo Ferra.
TJ responde – O juiz auxiliar da presidência do TJ, Irênio Lima Fernandes, contesta a afirmação do Ministério Público. Ele informou que o investimento tem sido distribuído principalmente para as comarcas e que o Tribunal já preparou licitação para trocar todo o equipamento das Comarcas, a fim de implantar o processo digital em 100% do Estado, o que deve acontecer até 2014.
Número de servidores
Apesar da dificuldade de trabalho e da morosidade processual nas comarcas, o Poder Judiciário de Mato Grosso é um dos quatro no país que tem o maior número de pessoal auxiliar da Justiça, cerca de 5 mil pessoas conforme levantamento do CNJ. Nosso estado perde apenas para Roraima, Acre e Distrito Federal, ficando 58% acima da média nacional.
Mas o presidente da OAB, Francisco Faiad, diz que há um déficit de 1,5 mil servidores na Justiça de Primeira Instância em Mato Grosso. E denuncia a existência de comarcas que são providas, em sua quase totalidade, por servidores cedidos pelas prefeituras auxiliados por estagiários, profissionais sem vinculação fixa com o Poder Judiciário.
Os estagiários são trocados quando finda os contratos, e os servidores das prefeituras podem ser remanejados a qualquer hora, o que faz com que esses profissionais, ao se adaptarem à rotina das escrivanias, sejam trocados por outros sem experiência. A mesma crítica, de falta de pessoal nas comarcas, foi feita pelo procurador-geral da Justiça, Marcelo Ferra.
O juiz auxiliar da presidência do TJ, Irênio Lima Fernandes, informou que o concurso realizado neste ano está suprindo essa demanda nas Comarcas, e que os funcionários cedidos pelas prefeituras já foram todos devolvidos. Além disso, informou o juiz, as medidas adotadas para implantar a tramitação virtual dos processos (pela internet) até 2014 vai demandar um número menor de servidores.