Se o patriotismo do brasileiro aflora a cada quatro anos, em época da Copa do Mundo, em Cuiabá esse sentimento é ainda mais fragilizado pela falta de uma identificação com os clubes de futebol local. É o que demonstra uma pesquisa realizada na dissertação de mestrado da jornalista e professora Lairce Aleluia de Campos, 40, em que investiga a relação de torcedores com os clubes e a seleção brasileira. Cerca de 71% dos torcedores cuiabanos ouvidos são de perfil festeiro, ou seja, sua conexão maior com o evento Copa do Mundo é mais pelo caráter do espetáculo e celebrativo do futebol, do que por uma questão de fanatismo ou pura paixão. Pesquisa também aponta grande superioridade da torcida do Mixto sobre as demais equipes de Mato Grosso.
“Esse é um dado que me chamou a atenção, esperava um outro tipo de perfil do torcedor. Essa fragilidade do futebol local influencia no tipo de torcedor que temos. A maior identificação deles é com clubes de referência nacional e a seleção brasileira”, explicou Lairce.
Entretanto, esse laço de amor à seleção é muito tênue. Para 59% torcer pela equipe canarinho é sinônimo de amor ao país, outros 52% dos torcedores compram acessórios com as cores do país e 26% demonstram seu patriotismo ao cantar o hino nacional.
Porém, essas mesmas pessoas são capazes de atear fogo na flâmula verde-louro e rasgar a camisa da seleção brasileira, em atos de raiva, como se viu na Fifa Fan Fest, após a derrota histórica de 7 a 1 para a Alemanha.
“O Brasil não tem muito o que se exaltar, além do futebol que é o único no mundo com a maior quantidade de títulos. A nossa desigualdade social é muito mais evidente. Quando a Copa acaba, tanto a derrota quanto a vitória são esquecidas um mês depois. A brasilidade é frágil”.
Contudo, 35% dos que assistiram aos jogos da Copa do Mundo disseram que assistiam, mas não eram fanáticos, 29% gostam do esporte, mas não vivem intensamente. Dez por cento dos entrevistados disseram ser fascinados pelo assunto e outros 9% não sabem nem viver sem futebol e querem saber tudo do tema.
Orientador da pesquisa, o sociólogo do esporte Francisco Freire Xavier Rodrigues explica que para que o torcedor cuiabano tivesse um perfil mais religioso de torcedor, aquele que sua conexão é tão forte como com o seu clube preferido, passa por uma reformulação do futebol mato-grossense.
“Na época em que o Mixto e Operário lotavam os estádios, apesar de profissional, o futebol não era tão valorizado empresarialmente como hoje, que requer dinheiro e mais gestão profissional. O conceito de clube/empresa tornou o torcedor como cliente, que consome os produtos. Para conquistar torcedores/clientes os novos clubes como o Luverdense e o Cuiabá precisam se manter em boas campanhas nos campeonatos para conquistar essas pessoas”.
Dos 48% dos entrevistados ouvidos que disseram torcer por clubes locais, 64% se disseram torcedores do Mixto e outros 26% do Operário. Apenas 5% faziam parte da torcida do Cuiabá Esporte Clube. Nenhum dos ouvidos na pesquisa na Arena Pantanal, Fifa Fan Fest, nas casas, bares e a Praça da Mandioca chegaram a citar o Luverdense. A maior parte dos entrevistados, 43% preferem assistir jogos de futebol em casa.
“O cara não se identifica com o futebol profissional. Entre ir às 15h para o Dutrinha assistir o Cuiabá contra o Cacerense, ele prefere ficar em casa e assistir na TV por assinatura e tomar a cerveja dele no sofá. Se a população local tivesse a tradição de clubes fortes, a situação seria outra. Nosso futebol é frágil e está na hora de repensar”.