98% dos peixes de 14 espécies que habitam os riachos amazônicos têm algo em comum: microplásticos no trato gastrointestinal e nas brânquias. Esse foi o resultado de pesquisa realizada pela professora Danielle Regina Gomes Ribeiro-Brasil, do Laboratório de Ecologia e Conservação de Ecossistemas Aquáticos (Lecea), vinculado ao Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS) do Câmpus do Araguaia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
O artigo “Dos rios e mares à mesa: peixes contaminados” faz parte do relatório “Fragmentos da destruição: Impactos do plástico na biodiversidade marinha brasileira” , publicado pela Oceana Brasil. O artigo indicou que polietileno, polipropileno, polietileno tereftalato, poliestireno e cloreto de polivinila representam 90% dos polímeros plásticos usados e dão origem à maioria dos microplásticos encontrados nesse ambiente.
Além desses números, a situação do Brasil não é nada confortável: além de ser o maior poluidor da América Latina, o país é o oitavo maior do mundo, cenário composto pelo descarte de 1,3 milhões de toneladas de plástico por ano no oceano.
“A Oceana Brasil é uma organização não governamental (ONG) dedicada à proteção e preservação dos oceanos e das suas espécies marinhas. A Oceana Brasil atua em diversas frentes para promover o uso sustentável dos recursos marinhos e a proteção de ecossistemas críticos. A importância social dos estudos publicados no relatório “Fragmentos da destruição: Impacto do plástico na biodiversidade marinha brasileira” da Oceana Brasil envolve aspectos de conscientização e educação ambiental. Ao divulgar informações relevantes de forma acessível, a Oceana ajuda a mobilizar cidadãos em prol da conscientização ambiental e preservação do ambiente. Além disso, há uma influência política, uma vez que o referido relatório pode auxiliar com dados científicos na regulamentação para a proteção dos oceanos e sua biodiversidade”, explica a docente.
“O relatório fornece informações científicas com dados expressivos sobre a poluição por microplásticos. Além disso, em especial o meu artigo, trata de poluição em peixes em riachos (também conhecidos córregos ou igarapés) urbanos, pois os centros urbanos estão inseridos no contexto hidrográfico e fazem parte da paisagem”, acrescenta.
A pesquisa afirma que o artigo mostra que os centros urbanos contaminam de diversas formas o ambiente aquático e os peixes de riachos estão se alimentando do que os centros urbanos estão jogando no ambiente.
“Se os peixes estão contaminados, significa que a água está contaminada e muitas vezes essa é a fonte de água potável para os centros urbanos. Por outro lado, é importante destacar que as comunidades tradicionais, bem como a população ribeirinha, que fazem usos diversos dos riachos (alimento, moradia, fonte de água etc.). As espécies estão contaminadas, se a população consumir estes os recursos dos riachos que estão contaminados, se contaminarão também. Já foi encontrado microplásticos no sangue, nos pulmões, na placenta, em vários órgãos, e recentemente no cérebro humano, possivelmente esta contaminação se deve da relação do ser humano com o ambiente em sua volta”, aponta.
“Falando da ictiofauna especificamente, estes peixes de riachos são peixes pequenos (em média dez centímentros de comprimento) popularmente denominados de piabas, algumas populações não se alimentam deles, as que se alimentam consomem eles fritos inteiros; esses peixes possuem uma importância ecológica muito grande, se alimentam de larvas de mosquitos, por exemplo, então fazem o controle biológico de vetores de doenças. Se estes peixes reduzirem a sua função no ambiente, poderá haver a proliferação em massa das larvas do mosquito da dengue e esses mosquitos irão infectar os centros urbanos das proximidades. Sendo assim, o relatório mostra a importância da preservação da biodiversidade aquática dos riachos”, explica a docente.
Sobre o impacto dos microplásticos nos organismos dos peixes, a pesquisadora explica que eles podem se distribuir por todo o organismo, a depender do tamanho da partícula. Segundo ela, partículas pequenas, menores que um milímetro, são mais fáceis de prender-se nas brânquias dos peixes e isto interfere nas trocas gasosas e transporte de íons para a respiração dos peixes.
“Além disso, interfere na captação de fonte alimentar para peixes filtradores. Partículas pequenas, de um a cinco milímetros, por exemplo, que ocupa o estômago de um peixe grande, tem efeito diferente de partículas que ocupam o estômago de peixes pequenos. As partículas ocupam o espaço de um item alimentar, causando a falsa sensação de saciedade, reduzindo o esforço de alimentação das espécies. É importante lembrar que os microplásticos não são nutritivos, irão reduzir a capacidade natatória e de reprodução das espécies. Além disso, há estudos mostrando que os microplásticos causam estresse oxidativo, alterando o sistema de defesa antioxidante”, finaliza.
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