O Grupo de Trabalho (GT) Prevenção e Combate à Violência Política de Gênero do Ministério Público Eleitoral (MPF) encaminhou uma representação, com pedido de avaliação, pela Procuradoria-Geral da República (PGR), quanto a eventuais providências apuratórias cabíveis na esfera criminal contra o deputado federal mato-grossense Abílio Brunini (PL). Ele é acusado de atos de transfobia contra a deputada federal Érika Hilton (PSOL). O caso teria ocorrido esta semana, durante os trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos Golpistas.
O GT do MPF quer que o caso seja apurado para verificar se houve prática de violência política de gênero, por uma suposta fala ou insinuação por parte de Abílio. O MPF aponta que a Lei 14.192/2021, que inseriu o artigo 326-B no Código Eleitoral, tipifica como crime condutas de assédio, constrangimento, humilhação, perseguição ou ameaça praticadas contra mulheres candidatas ou ocupantes de cargo eletivo, que buscam impedir ou dificultar a realização de campanha ou o exercício do mandato. A legislação prevê pena de 1 a 4 anos de prisão, quando for comprovada a prática criminosa.
O caso foi enviado à PGR em razão do foro por prerrogativa de função do deputado federal. “Os fatos dependem de apuração, inclusive mediante análise do sistema audiovisual do local onde se estabeleceram os debates, das câmaras de filmagens, depoimentos de testemunhas, entre outras diligências cabíveis”, afirma o GT, na representação.
O grupo lembra, ainda, que, ao tipificar como crime a violência política de gênero praticada contra candidatas e eleitas, o artigo 326-B do Código Eleitoral protege todas as mulheres, incluindo cis e trans. “Esse entendimento está consolidado em doutrina e jurisprudência, atendendo inclusive a Tratados de Direitos Humanos firmados pelo Brasil. Como exemplo similar dessa aplicação, o GT cita decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que aplicou a Lei Maria da Penha a casos envolvendo mulheres transgênero”, afirmou o MPF.
De acordo com o GT, a análise da fala do parlamentar, caso confirmada, poderá configurar, não apenas constrangimento, humilhação e perseguição contra uma parlamentar no exercício da sua função, como um ataque a todo grupo de mulheres trans eleitas, com o propósito de impedir ou dificultar o exercício do mandato.
Conforme Só Notícias já informou, o presidente da CPMI que investiga os ataques golpistas do dia 8 de janeiro, deputado Arthur Maia (União Brasil – BA), determinou à Polícia Legislativa que apure a acusação de que Abílio foi transfóbico durante o depoimento do ex-ajudante de ordens do então presidente da República Jair Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid.
Segundo o senador Rogério Carvalho (PT-SE), Brunini proferiu comentários transfóbicos no instante em que Erika Hilton começava a questionar Mauro Cid, que estava prestando depoimento por suspeita de participar de uma conspiração para reverter o resultado eleitoral do ano passado, inclusive com planos de uma intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A deputada Erika Hilton é transexual.
Brunini negou ter sido desrespeitoso com a deputada federal, chegando a receber o apoio de outros parlamentares. Por outro lado, ao menos outros dois parlamentares, incluindo a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), afirmaram ter ouvido Brunini se referir à intervenção de Erika Hilton em tom jocoso, mas diante da negativa do deputado, o presidente da comissão decidiu acatar a sugestão do senador Rogério Carvalho e determinar que a Polícia Legislativa tente esclarecer os fatos.
Horas após o presidente da comissão anunciar sua decisão e diante da repercussão do caso, o deputado Brunini pediu a palavra para apresentar sua versão. Ele voltou a negar ter dito qualquer coisa sobre a deputada Erika Hilton, e pediu que a análise das imagens e do áudio registrados no momento em que a deputada falava seja concluída rapidamente.
“[No primeiro momento] tratei isso como uma acusação que não daria em nada, até porque não tem nada no que dar. Levei com humor porque achei muito cômico a forma e as acusações que estavam fazendo. Mas precisamos restabelecer a verdade”, disse o parlamentar, reagindo às notícias veiculadas por sites jornalísticos e às mídias sociais.
“Não há [nos vídeos já divulgados] sequer uma palavra minha de homofobia; de ataque à Erika e nem a ninguém. A Polícia Legislativa pode investigar o que for. Não tem um ataque meu à Erika, a quem tenho tratado com respeito. Não desferi nenhuma palavra direcionada a ela, nem a nenhum outro parlamentar. Nem por questão de gênero, nem por nada. Não tenho interesse algum em destratar qualquer pessoa e não aceito que seja atribuído a mim o título de homofóbico ou de transfóbico. Por isso, peço ao senhor que a investigação seja célere. Até para que eu possa apresentar [representação por] denúncia caluniosa contra mim”.