Acompanhamos a evolução da política e da gestão pública há algumas décadas, e como resultado de uma rica experiência pessoal, para além dos livros, nos é permitido dizer com alguma propriedade sobre a política e os políticos.
Ouçamos as ruas (estamos nela!).
A Primavera chegou (embora ainda estejamos no mês de junho), agora nada será como antes, e quem não acreditar não irá sobreviver. Pode mandar a polícia "baixar o porrete", obter liminares de juízes inescrupulosos para impor censura à imprensa proibindo a divulgação das manifestações e debates (logo, logo, vão fazer isso), que o momento agora é outro (isso não surtirá efeito). O povo não se calará. Cada ameaça à liberdade de expressão será respondida a altura. E isso não é uma ameaça, mas um simples constatação.
A Rede Globo, outrora poderosa e dominante, está sendo hostilizada nas ruas (embora os seus repórteres não tenham culpa pelas culpas de seus patrões). Os sites da revista Veja na internet e dos partidos políticos estão sendo haqueados.
A culpa de tudo (da revolta), por evidência, é dos políticos e dos partidos políticos que adotaram uma velha tática oligárquica e cartorial de manter estruturas partidárias (podres) a serviço de interesses que não são os da maioria do povo. A indignação que se vê em nossas ruas, nas escolas, nas filas de bancos, nas igrejas e nos supermercados é "contra tudo o que está aí", mas ela tem os alvos muito bem definidos.
Ora, cada um sabe o que significa estudar em uma escola depredada e sem recursos (pedagógicos), com professores desmotivados e mal remunerados. É bom não olvidar que há muita violência nas escolas, inclusive de alunos contra professores, e esse sentimento (e reações) agora saltaram o muro escolar.
Aquela minoria de exaltados que ateia fogo e quebra os bens públicos e privados (durante as manifestações) já o fizeram antes na escola e não foram ouvidos (quando reivindicavam passe livre). Há alguns meses um jornalista publicou uma reportagem mostrando que uma gangue juvenil de um bairro Várzea Grande se valia de táticas de guerrilha.
Isso é verdade.
O quadro de deterioração dos serviços públicos por causa da corrupção é insustentável (e a culpa e dos políticos).
É impossível encontrar uma família mato-grossense que não tenha um de seus membros ou pessoa próxima que tenha, em algum momento, sofrido com a falta de medicamentos no hospital público, tenha sido obrigada a aguardar meses por um atendimento, inclusive com o perecimento de vidas de entes queridos.
E tem o caos no serviço de transporte, empresas de propriedade de políticos e que prestam um serviço lastimável. Sobre essas máfias(empresas de ônibus) falaremos n"outro momento, com a atenção que o caso merece.
Isso tudo tem uma causa: a corrupção. A corrupção mata, ela ceifa vidas, ela joga as crianças nas ruas, que viram reféns do tráfico, estamos dizendo isso há anos, como base em dados que são públicos (de organizações de combate à corrupção).
Mas os políticos não queriam entender.
A fortiori, agora deverão fazê-lo, ou o modelo cai.
Durante recente momento eleitoral, havia rumores de que o descontentamento da sociedade brasileira iria se traduzir em votos nulos, brancos e abstenções. Preocupada, a Justiça Eleitoral veiculou nos canais de televisão e rádios diversas peças publicitárias, argumentando que o voto era um direito do cidadão (mas na verdade é uma obrigação). Muitos se levantaram, pedindo às pessoas para que não anulassem o voto, ao argumento de que isso não seria a solução.
Ora, se você não votar no dia da eleição, paga uma multa de R$ 3,50 (três reais e cinquenta centavos) e fica tudo bem. Já que os políticos não te ouvem, nada mais justo que você não os ouça quando vieram lhe pedir votos.
Não votar também é uma atitude política.
Muitos estão a dizer que a geração atual, que está aos milhares nas ruas, seria despolitizada e ao se negar a aceitar partidos políticos nas manifestações, seriam fascistas e despolitizados.
Ora, primeiro que o termo fascismo vem de "fasces", símbolo que já representou (o poder dado a) magistrados em uma fase do Império Romano. Ao longo do tempo a palavra fascismo passou a ser associada a qualquer sistema de governo que abusa da propaganda e da censura, cooptando as pessoas econômica, social e culturalmente, sustentando-se no nacionalismo (às vezes na xenofobia).
Não é bem o caso.
Além de não fascistas, os ativistas e manifestantes que estão nas ruas se abeberam de outra fonte de formação política. É só você ter o cuidado de assistir ao programa CQC (Custe o que Custar) transmitido regularmente pela Tv Band. Há ali um quadro chamado "controle de qualidade" onde os políticos são entrevistados e testados, a maioria reprovados.
Deste programa saíram dois comediantes que fazem muito sucesso nos palcos (stand up) e influenciam em muito a atual geração: Rafinha Bastos e Danilo Gentili. Assista os vídeos "Arte do Insulto" e "Politicamente Incorreto" no endereço www.youtube.com.br e você nos dará razão. Os caras são politizados, embora diferentes da geração que lutou pelas "Diretas Já", dos "cara pintadas" que foram às ruas pelo impeachment de Collor ou daqueles que se ativaram contra a Ditadura.
A nossa Primavera é bem mais alegre (Arbor ex fructu cognoscitur). Primeiro vai às ruas, nega os partidos políticos, depois deixa de votar. Afinal por que depositar votos em políticos que desejam anular a Lei da Ficha Limpa?
Antonio Cavalcante Filho e Vilson Nery são ativistas do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral)