Ao enfatizar o descalabro e a baixa qualidade que marcam a educação brasileira em meu último artigo recebi alguns e-mails com comentários a respeito. Algumas pessoas imaginam que este é um problema que vem de séculos, culpam o passado escravocrata, o elitismo de nossos governantes ao longo de nossa história. Outros chegaram até a comentar que esta seria uma herança maldita recebida pelo governo Lula de seu antecessor e o que acontece em nossa educação, na saúde, na segurança e, enfim, em todos os setores da vida nacional seria culpa da ditadura militar que vigorou no país entre 1964 a 1985. Todavia, essas pessoas se esquecem que já se passaram 25 anos em que o poder tem sido exercido por civis, todos democratas e preocupados com o bem-estar e a felicidade geral do povo, incluindo o governo que se finda e que terá continuidade por mais quatro anos.
Ao todo, se considerarmos os cinco anos de Sarney, um intelectual e expoente do PMDB, o período Collor/Itamar, mais os oito anos de FHC, outro intelectual, professor universitário e mais oito de um operário fundador e líder máximo de um partido de esquerda, obreirista são 25 anos (mais tempo do que o Brasil foi governado por generais presidentes) e que somados aos próximos quatro de Dilma completarão quase três décadas, tempo mais do que suficiente para mudar a cara da educação brasileira e não ficarmos buscando culpados nas cinzas do passado.
No entanto, os dados que a cada ano são apresentados para avaliar nossa educação não indicam que o Brasil irá surpreender o mundo como aconteceu com a Coréia do Sul, a China, a Índia e outros países que fizeram uma verdadeira revolução social e econômica a partir de transformações profundas nos sistemas educacionais. No início da década de sessenta esses países estavam praticamente no mesmo patamar ou piores do que o Brasil em termos de indicadores sociais e econômicos.
Ainda sobre o Pisa, o estudo que avaliou o desempenho dos alunos em vários países, três pesquisadores, Eric Hanushek da Universidade de Stanford, Paul Peterson de Harvard e Ludger Woessmann da Universidade de Munich, em artigo deste mês na The Atlantic Magazine, dos EUA, intitulado "your child left behind", traduzindo em português seria "Seu filho deixado pra trás", esmiuçaram um pouco mais os dados do Pisa em relação ao desempenho dos alunos desses países em matemática, ciências e leitura.
O foco do artigo é para situar cada estado americano e mais dez grandes cidades dos EUA no contexto dos países que realizaram o Pisa. Estabeleceram como parâmetro de análise o percentual de estudantes que em cada país tiveram notas consideradas de alto desempenho (acima de 90, em uma escala de zero a cem).
O maior desempenho, com 28,8% de estudantes com alto rendimento ficou com Taiwan, seguido por Hong Kong com 23,8% e a Coréia do Sul com 23,2%. O Brasil, para variar, ficou quase no final da tabela com apenas 0,8% dos alunos incluídos no grupo de elite da matemática. Pior do que em matemática foi o desempenho de nosso país em ciência, onde apenas 0,1% dos alunos fazem parte do referido grupo e 0,3% em leitura. Convenhamos, isto é um grande vexame e deveria ser motivo de vergonha para nossos governantes, mas parece que acharam ótimo o desempenho do Brasil, basta ver as declarações do ministro da Educação a respeito do assunto. Se forem excluídos os alunos das escolas federais e das escolas particulares dos cinco estados que melhor desempenho tiveram, o Brasil cairia mais ainda no ranking, talvez ficasse entre os três ou quatro últimos países. Este é o retrato da educação pública em nosso país. Mas parece que isto não faz parte das prioridades de governo.
Para comprovar este vexame basta analisarmos melhor o resultado do Ideb, que é calculado a partir de dados sobre aprovação escolar, obtidos no censo escolar; médias de desempenho nas avaliações do Inep, o Saeb e a Prova Brasil. Existe uma série histórica que possibilita acompanhar o "avanço" entre 2005, 2007 e 2009.
Interessante nesta questão é que as metas estabelecidas pelas autoridades educacionais são quase ridículas, pois se contentam em ter como referência atingir em 2021 e 2024 a média atual dos países da OCDE que é 6,0. Por certo naquelas datas a média do Pisa dos países da OCDE deverá ser bem próxima de nove ou dez e o Brasil continuará bem feio na foto como vem acontecendo nos últimos anos, amargando os últimos lugares.
Em uma escala de zero a dez, o Ideb de 2009 para as séries iniciais do ensino fundamental foi de 4,6 e no Norte e Nordeste de 3,8. Nas séries finais do ensino fundamental Brasil 4,0; Nordeste 3,4 e no Ensino médio, Brasil 3,6; Nordeste e Norte 3,3. Cabendo destaque para o Piauí que foi de apenas 3,0. Mato Grosso neste quesito ficou com média 3,2 abaixo das médias do Brasil e do Centro-Oeste.
Seria interessante uma análise do desempenho dos alunos do ensino fundamental nas escolas rurais, nas pequenas cidades e nas periferias dos grandes centros urbanos, correlacionando o desempenho a outros fatores como rede física, alimentação escolar, formação e níveis de satisfação do corpo docente e outros indicadores. Quanto ao ensino médio o Enem traça um panorama assustador. Ai sim pode-se ter uma radiografia mais real de como está a educação brasileira e que futuro estamos construindo.
Juacy da Silva é professor universitário,UFMT, mestre em sociologia, Ex-Diretor do IPDU e ex-Ouvidor Geral da Prefeitura de Cuiaba
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