Mais de cinco mil processos findos e ativos tramitam na Segunda Instância do Poder Judiciário de Mato Grosso, referentes a realização de concursos públicos. As situações são inúmeras, mas uma grande parte trata-se de questionamentos de editais que, em alguns casos, fazem exigências consideradas esdrúxulas, dando margem à judicialização.
Em muitos casos fica evidente a desqualificação das empresas contratadas para organizar os certames. Em outros, a falta de responsabilidade de gestores públicos. Isso porque, em diversos processos revela-se um grande número de realização de novos concursos na vigência do prazo de validade do anterior e ainda contratação a título precário dentro do prazo de vigência do certame.
Por conta deste tipo de conduta, há muitos casos de pessoas que passaram dentro do número de vagas previsto no edital e não foram chamadas de imediato, tendo que se valer de ações judiciais para garantir a posse. Antes a aprovação dentro do número de vagas era apenas uma mera expectativa de direito, hoje já é considerado um direito subjetivo à nomeação por todos os tribunais.
Diante de tantas falácias, o presidente da Comissão de Concursos do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, desembargador Paulo da Cunha, pondera que a judicialização não acaba sendo ruim, mas necessária. "Quando um edital lesa um direito, ele não pode escapar da apreciação da Justiça. O edital é um ato administrativo, portanto é fonte secundária do Direito e não se sustenta se não tiver em consonância com a lei". O magistrado destaca ainda a necessidade de se ter primor na elaboração do edital.
O gerente de Exames e Concursos da Secretaria de Articulação e Relações Institucionais (SARI) da UFMT, Abrahão Lincon de Oliveira, destaca que alguns editais exageram quanto às medidas de segurança do concurso e outros quanto aos requisitos para a investidura no cargo. Alguns proíbem inclusive do candidato levar lanche devido a episódio de ter sido encontrado um celular dentro de um pacotinho de barra de cereal. Ele lembra que este tipo de controle não deve ser feito via edital, mas pelos fiscais de sala. Outros requerem experiência mínima de um ano para a investidura no cargo. "Isso a gente não coloca nos nossos editais porque tem a Lei do 1º Emprego", destaca.
O edital de um concurso da Polícia Civil, na Bahia, acabou virando assunto de repercussão nacional, em razão de algumas exigências digamos "inusitadas". Para os cargos de delegada, escrivã e investigadora exigia-se que as candidatas fizessem exame ginecológico ou atestasse a virgindade. A situação deu margem a inúmeros protestos pelo fato do requisito não ter relação alguma com as atribuições do cargo.
Além disso, alguns editais não se atentam para as características de cada carreira e pecam ao estabelecer remuneração e carga horária, como ocorreu com o edital lançado recentemente pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, que classificava o radialista como profissional com ensino médio, mesmo a UFMT formando vários profissionais nessa área todo ano.
O edital foi retirado da praça para ajustes e até agora não foi relançado. Conforme o advogado do Movimento de Combate à Corrupção, Vilson Nery, a empresa escolhida para organizar o certame é desqualificada, nunca preparou um único concurso, e se continuar à frente o processo seletivo estará fadado ao fracasso.
"Se essa banca continuar este concurso será aquele que nunca vai acabar, porque vai ser questionado eternamente na Justiça. O segundo edital que fizeram ficou ainda pior que o primeiro. Há muitos critérios subjetivos e quando trata da segunda etapa do exame, a prova prática, não há detalhamentos de como ela irá ocorrer".